9.09.2010

Saramago, biografia!


Antes de qualquer palavra é preciso que eu peça desculpas, pois de maneira alguma conseguirei, nesta coluna, dar conta do papel a que me propus já faz algum tempo: resenhar sobre um livro. Impossível porque escolho, de maneira egoísta, uma obra da qual retiro imensa satisfação e que trata de um dos melhores autores de todos os tempos.
A biografia de José Saramago, escrita por João Marques Lopes, me chamou a atenção, em primeiro, pela capa. Nela, um homem velho segura seus óculos e escora, pensativo, o queixo em uma das mãos. Um homem que nasceu numa época de guerra, miséria e analfabetismo. O homem da capa carrega um olhar triste e, talvez, cansado. Um olhar de Saramago.
Criador de um estilo único de linguagem (o saramaguiano), autor de livros célebres, prêmio Nobel em 1998, comunista e inconformado desde sempre, José Saramago desafiou seu destino e, como diz o dito popular, “mostrou a que veio”. E como mostrou.
Sua primeira obra, de 1947, chama-se Terra do pecado e rendeu pouquíssimas edições. Depois dela vieram Poemas possíveis, A bagagem do viajante, O ano de 1993, Levantado do chão (obra que marca o início do estilo saramaguiano de contar história – com parágrafos longuíssimos, pontuação escassa, detalhismo e criatividade em abundância), Que farei com este livro?, Viagem a Portugal, Memorial do convento, O ano da morte de Ricardo Reis (o “Pessoa” que Saramago demorou a descobrir), A jangada de pedra (que surgiu após uma conversa despropositada com a jornalista brasileira Cremilda Medina), A segunda vida de Francisco de Assis (sobre o seu irmão que morreu aos dois anos de idade com broncopneumonia), História do Cerco de Lisboa, O evangelho segundo Jesus Cristo (polêmica obra que fez o governo português e igreja católica refutarem a posição do autor. Após este período Saramago se “auto exila” na ilha de Lanzarote), Ensaio sobre a cegueira (livro que o próprio autor pensou não ser capaz de sobreviver), Todos os nomes, A caverna, O homem duplicado, Ensaio sobre a lucidez, As intermitências da morte, A viagem do elefante, Caim (último romance do autor), Cadernos de Lanzarote (com cinco publicações), O Caderno (publicação dos textos disponíveis no blog do autor), para citar apenas alguns. A lista de livros só não é maior que o legado por ele deixado.
Por fim (e eu havia avisado que seria pouco o espaço), um dos maiores autores de todos os tempos, é oriundo de uma família analfabeta, em que o único curso que fez foi o de cerrilheiro mecânico e que nem Saramago deveria se chamar. O erro, do funcionário que o registrara, foi um dos tantos que o autor aprendeu a enfrentar. Assim como aprendeu sobre a desigualdade social, o preconceito, a violência e a pobreza. Assim como aprendeu sobre os cegos que mesmo vendo, não veem. Destes, Saramago já nos avisou, da maneira mais original possível. De uma forma que só um grande homem, mesmo com olhar pensativo e cansado, consegue.

Boa leitura e até a próxima semana!

De repente, nas profundezas do bosque



Ler histórias infantis sempre nos faz refletir um pouco mais sobre a maneira como conduzimos nossas atividades, seja no trabalho ou em casa, com a família. Nos faz parar para pensar sobre o que elencamos como vital em nosso cotidiano e, por estas características, se tornam histórias encantadoras.
O livro (infantil) desta semana, em primeiro lugar, me despertou três perguntinhas, são elas: quem nunca quis fugir? Sair pela porta da frente e nunca mais voltar. Deixar os problemas financeiros de lado; a conversa inacabada de outro e seguir, sem rumo, pensando apenas no próximo caminho? Quantas vezes nos deixamos abater por opiniões de terceiros e passamos a ser influenciados por pessoas que se julgam melhores e superiores? E, por fim, quantas vezes desejamos voltar a ser crianças para deixar de lado os compromissos, obrigações, negociatas e decisões?
O mundo das crianças, referenciado por muitos adultos como algo quase utópico, revela um universo onde só coisas boas acontecem. No entanto, como contentar-se não é um verbo muito em uso pelo ser humano, quando crianças desejamos logo sermos adultos para, então, fazermos nossas próprias escolhas, decidirmos a roupa e o brinquedo que queremos comprar, escolhermos o canal de TV, sem ninguém reclamar, etcétera. No entanto, apesar desta divergência de vontades e anseios, algumas pessoas (adultas e crianças) parecem sempre conter um segredo que lhes fazem ser mais feliz. Segredo como o de Maia e Mati, duas crianças de um pequeno vilarejo criado por Amós Oz.
O pequeno vilarejo onde vivem passou, há algum tempo, por uma espécie de maldição. Maia e Mati só ouviram falar deste período (onde existiam animais de todas as espécies, desde aves, répteis, peixes) e, aos poucos, vão entendendo que segredo é esse. Mas, como cita o autor, “acontecem aqueles momentos em que todos nós sem exceção, nos assustamos e ficamos apavorados, às vezes ficamos cansados, ou com fome; momentos em que nos empenhamos muito para que fique tudo bem, não muito quente nem frio” e, nesses momentos, nos igualamos a qualquer outra espécie, nos igualamos a qualquer coisa, indiferente do que fazemos, da nossa idade ou da nossa condição social. Pois “todos nós, sem exceção, tentamos a maior parte do tempo nos preservar e nos guardar de tudo o que corta, morde e fura”. Ou seja, todos nós temos apenas um interesse: se preservar.
Porém, esta é só uma história infantil e você, provavelmente, esteja abarrotado de trabalho, sem tempo para este tipo de conversa.

Boa leitura e até a próxima semana!