1.18.2010

Peripécias em verde e amarelo

O dia era uma quarta-feira qualquer. Dessas em que a mesa está cheia de papeis, bilhetes com tarefas a fazer e um telefone que não para de tocar. Em meio a todo o rotineiro alvoroço, a porta do escritório se abre e calmamente ele entra. Um amigo que conheci há pouco tempo, mas que dificilmente será esquecido. Nas mãos carrega a tradicional pasta que, provavelmente, contém livros, textos e um emaranhado de outros bilhetes. Com o jeito gentil de sempre, apresenta o mais novo fruto do seu trabalho: “Peripécias em verde e amarelo”. Na terceira página lá está a dedicatória: “À minha amiga Silvane, com o desejo de muitas gargalhadas, um abraço Torres Pereira”.
Em seu 16º filhote literário, como ele mesmo o intitula, Torres Pereira revela a cara do Brasil. Um país que ele assumiu como pátria desde 1976 depois de lutar como combatente de guerra na África e trabalhar como correspondente português num jornal em Zimbábue.
Começo, então, a leitura dois dias após receber o presente e penso, realmente, que gargalhadas me acompanhariam a cada virada de página. Me defronto, então, com a o contrário das piadas que eu acreditei existirem.
No livro, Torres nos fala muito bem sobre esse país que tem na contradição sua mais completa definição: de um lado a riqueza, de outro a pobreza; a inovação tecnológica e o analfabetismo; as mansões e as redes de esgoto a céu aberto; o salário mínimo e as pensões vitalícias; as belezas naturais e as favelas; a tristeza de não ter o que comer e a alegria em poder ajudar a quem sequer se conhece.
É desse Brasil que nos fala o autor português, mas não exatamente nessas palavras. Torres fala daqueles que poderiam mudar esses exemplos; daqueles que tem o poder nas mãos, mas que o usam apenas em seu próprio benefício. Torres apresenta aquela laia que receamos ter na família; que desejamos manter afastados e que, no entanto, deveriam ser o nosso porto seguro. A eles deveríamos levar nossas preces; estender nossos pedidos e cobrar verdadeiros milagres. Até porque, mesmo Deus sendo brasileiro não estamos dando conta e, ruim mesmo, pode ficar quando resolvermos desacreditar numa mudança. Quando escutarmos o horário eleitoral e percebermos que tudo não passa de uma mentirazinha; quando virarmos as costas para promessas toscas e passarmos a exigir, verdadeiramente, atitudes de homens. Homens que não pensem em tirar o dinheiro das nossas contas bancárias; que não empreguem a família toda em serviços públicos; homens que trabalhem como tantos outros, de sol a sol e que ainda possam sorrir. Que consigam eles gargalhar porque, afinal, tudo não passa de uma levada peripécia.

Boa leitura!

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