Passeava pela livraria e buscava entre os autores já conhecidos algum título que, no momento, despertasse a minha atenção. Na segunda olhadela desisti e optei por este livro que vos segue: “O gerente”, de Carlos Drumond de Andrade. Com a primeira versão publicada ainda em 1945, com ilustrações de J. Moraes, “O gerente” de agora vem revisado, de acordo com o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, e apresenta ilustrações do argentino Alfredo Benavidez Bedoya.
Trata-se de um conto. O conto que traz um Rio de Janeiro modesto, tranquilo e seguro. É nesta cidade que conhecemos Samuel, o gerente em questão, que a exemplo de muitos outros brasileiros conquista seu espaço profissional com trabalho sério e dedicado.
Um homem que tinha tudo para ser um bom marido, mas que se descobre incapaz de tal ato. Reclusa-se a viver sozinho, numa rotina de galanteios, coquetéis, jantares, bailes e comemorações. Samuel revela-se uma figura amorosa, respeitável e coerente. No entanto, como coerência não garante estabilidade, casos estranhos passam a acontecer e, de repente, este mesmo homem passa a ser julgado pelo crime das dentadas. Um tanto antropofágico, o conto revela um caso de pequeno mistério. Nem raiva, nem rancor, nem desprezo. Apenas mistério, incredulidade e alguma desconfiança. Seria, Samuel, capaz de tal audácia? Para que tamanha ousadia?
Nem o conto, nem Samuel, nem Carlos Drumond de Andrade respondem tais perguntas. E talvez seja esta uma das intenções da obra: deixar a bola picando. É o pensamento que ora é isso, ora é aquilo; os devaneios; a ideia que não chega a ter um fim e se perde no meio de outra que surge; é o conto; a literatura; o hábito de não por um ponto final em tudo. É a vida sob outra perspectiva: sem exatidões, respostas ou resultado final. É a vida inconstante, surpreendente e inquietante. É o Samuel, é você é cada um ao mesmo tempo fazendo tudo diferente.
E sobre o causo, ficou assim. Samuel partir para São Paulo. Fazia muito calor no Rio e o gim já não bastava mais. Mas as dentadas...
Boa leitura!