10.30.2008

A incrível e triste história da Cândida Erêndira e sua avó desalmada


Muito se fala em consumismo, marca e o valor que damos a ela. Não são poucas às vezes que pagamos caro por ela (e em muitos casos é só por ela mesmo!). Falando em pagar caro, qual o maior valor que você investiu em algo ou qual a sua maior dívida? Quantos foram os dígitos que por dias te atormentou e o levou à lotérica (ou qualquer banco) para saldar a conta? Talvez seja melhor nem lembrar... É claro que esse cálculo (de o que é bastante ou pouco) depende da condição social e do poder aquisitivo de cada um. Mas e sua dignidade, por quanto venderia? Sem preço? A de Cândida Erêndira custou um dia de cansaço, equivalente a 872.315 mil pesos.
No caso de Erêndira, dignidade tem preço sim, mas este pode variar de 250 a 50 pesos, dependendo da proposta do comprador. Quem é Erêndira? É a bastarda de 14 anos criada por Gabriel García Márquez em “A incrível e triste história da Cândida Erêndida e sua avó desalmada”. Essa bastarda (que azar!) teve a infelicidade de, após um dia exaustivo de trabalho, deixar queimar toda a fortuna de sua avó (desalmada). Sem outro recurso, paga com a única coisa que tinha passível de venda: o sexo. Mas calma lá! O livro não é pornô gente! O que o autor nos fala é que, sem perceber, aos poucos Erêndira vendia mais. Vendia sua esperança, sua juventude e, principalmente, vendia aquilo que caracteriza a todos como seres humanos. Com isso ele nos faz pensar: será que também ela se tornaria desalmada como a avó?
É assim, dando nó na cabeça, que Gabriel García Márquez nos apresenta mais uma história. Destas que nos fazem pensar, delirar sobre o que nós mesmos fazemos, ou deixamos de fazer. Pensei, por exemplo, até que ponto somos capazes de “nos vender” ou, ainda, qual o preço de nossa vida? É possível perceber isso em números? Não sei, assim como não sei precisar de um todo o que quis nos dizer o autor. Afinal, até que ponto temos preço, somos nós também desalmados? Desalmados, de acordo com definição do dicionário Michaelis, significa “desnaturado, desumano, perverso; que não tem consciência; que mostra maus sentimentos”. Pensando bem, acho que realmente não somos desalmados. Egoístas, mesquinhos, complacentes, narcisistas, talvez. Quem sabe até gulosos e insensíveis. Mas desalmados não! Não é porque não damos a mínima às questões ambientais, ou porque pensamos apenas no dinheiro (lucro, compras), beleza, fofoca, nem tão pouco por desacreditarmos em outro modelo econômico, na paz do mundo (incluindo o Iraque...). Não é por nada disso que seríamos considerados desalmados. Isso não! Talvez bárbaro seja a palavra certa. Por enquanto, sem definição exata, fazemos de conta que o problema (que problema?) não é nosso. Assim é mais fácil. Resta mais tempo para falar do futuro (que futuro?), dos nossos planos (econômicos) e nossos objetivos. Pensando só em nós mesmos o trabalho é menor. Assim somos mais felizes e de almas puras (e não desalmados!).

Boa leitura!

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