4.14.2009

O ovo e a galinha

Quando pensamos em nossa vida (o que não acontece a todo o instante), por mais modestos que sejamos, sempre sentimos em nós uma utilidade. Algo que pensamos não ter outra pessoa capaz de fazer, falar ou escrever, nem que seja a mais ínfima utilidade de fazer outra pessoa feliz. Sabemos que há muito chão pra percorrer, que não somos os melhores, nem os mais justos e corajosos. Não esperamos ganhar uma medalha, mas sabemos que, de alguma forma, e por algum motivo, somos importantes.
Assim pensava até ler o conto de Clarice Lispector, “O ovo e a galinha”, ao qual me defrontei com outra possibilidade. Após anos tencionando que era “importante” e que merecia esse tempo de passagem pela vida, a autora aparece com a idéia de, talvez, sermos apenas corpos agentes utilizados para “camuflar” algo de maior que existe dentro de nós.
Esse pensamento leva a esquecer a noção de individualismo e até mesmo a de ser humano. Como “agentes disfarçadores” perdemos toda e qualquer caráter de autenticidade, conhecimento, poder decisório. Nada mais existe que não um corpo carregando algo, tal como faz o ovo com a galinha. Ela é apenas um espaço que abriga o ovo, diz a autora. Um corpo do qual o ovo se apropria para seguir o seu caminho. Tudo o que ela faz é apenas para disfarçá-lo de modo que ele exista.
Pensei, então, no que nós fazemos; o que guardamos dentro de nós; o que disfarçamos; qual o ovo se utiliza de nosso corpo? Será que conseguimos perceber isso ou apenas guardamos algo do qual nem imaginamos?
Quando fala do ovo, Clarice Lispector traz ainda a idéia de que se olharmos demais para ele, o perdemos. Ou seja, ele é ovo até que olhemos para ele. Depois que pararmos o olhar e um pouco mais de compreensão, ele se perde. Nada mais é que um ovo quebrado.
Talvez isso também aconteça conosco, agentes do ovo. Talvez seja essa a grande contradição do ser humano: olhar demais para entender. Entender e perder, pelo simples fato de que tudo é puro e único até que alguém olhe, até que alguém se atreva a simplificar em palavras. Quando isso acontece, o ovo quebra e a galinha seca. Sem interior, nem razão para viver.


Boa Leitura!

3 comentários:

Zoopas disse...

Muito boa a reflexão.

Anônimo disse...

Gostei muito da sua resenha, li o conto e tava tendo alucinações devido as metáforas, obrigado por me ajudar a entender.

Unknown disse...

parabéns