3.18.2009

Diário de um louco


O hábito de escrever em diários é tão antigo quanto a própria história da escrita (ou, quase isso). Neles uns são mais detalhistas, outros mais enfadonhos. Não importa. O essencial é escrever. Nesse grupo de amantes, há também os fissurados por cartas. Muitas vezes, escrevem-nas e não entregam ao destinatário, mas continuam a produzi-las por puro prazer. Há ainda quem não entende “patavinas” o porquê desse gosto em juntas letras, formar palavras e produzir um sentido. No entanto, gostando ou não, todos, com raras exceções, já fizeram algo do tipo.
Os diários pertencem a algo mais particular do sujeito, que diz respeito ao relato de coisas feitas, pensadas e imaginadas. Também ali são relatados pensamentos censurados e tímidos, que cabem apenas a quem escreveu. Talvez por isso, quando uma pessoa lê o diário de outra, a possibilidade de compreender o que está proposto se dá na mesma proporção que a de não entender nada e fazer até mesmo um julgamento errôneo.
Apresentada essa forma de comunicação milenar, falamos agora de literatura e demência. Imaginem esses elementos aliados em um mesmo diário, na mesma obra, mesma história, na mesma pessoa e você terá “Diário de um louco”, de Gogol.
A dobradinha de resenhas do mesmo autor se deu pela curiosidade e incerteza sobre o que é lúcido ou não nesse mundo de loucos. Ao iniciar a leitura, sinto uma incerteza de que aquilo faz parte de um registro insano ou se é apenas um diário. As falas e narrativas não parecem ser distintas ou estremadas daquilo que cotidianamente vemos. São expressões e confissões de uma pessoa qualquer com seus sonhos, desejos, ambições e, não podia ser diferente, ilusões.
Ao passo que conhecemos o protagonista da história, temos contato com a realidade e o pensamento de uma pessoa como nós: que não entende certas hierarquias e maneiras diplomáticas de se chegar aonde quer, mas que simplesmente “quer”. No entanto, “ele” desperta esse querer de forma imaginativa e as traz para a realidade. Fazendo isso, assusta; se apodera de personalidades que não lhe dizem respeito; trava duelos com aqueles que não acreditam na sensatez de sua insanidade e vive. Tal como nós: vive num mundo de ilusões, onde fingimos sermos pessoas que sequer conhecemos, desejamos aquilo que não temos, fazemos de conta que os outros, esses sim, são loucos, mas não nós. Pensando bem, talvez não sejam tantas as diferenças entre nós e pessoas como ele. Pelo menos não em diários!
Fica o convite para aqueles que quiserem mais que apenas viver e desejarem ver escancarada a vida de um louco. Certamente uma insanidade diferente da nossa, diferente da nossa rotina. Nós, os lúcidos, que pouco sabemos de insanidade e extravagâncias teremos, possivelmente, que fazer um exercício para entender esse relato demente e fugaz. Mas, como disse o autor: “chega. Basta. Eu me calo!”.

Boa Leitura!

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