9.30.2009

Gritos de Liberdade


Todo e qualquer conflito reflete a expressividade de pensamentos opostos. Há aqueles cotidianos, dos quais conhecemos bem; mas há, também, os que dificilmente conseguimos compreender o porquê acontecem. Não digo, aqui, que não entendemos as razões políticas e econômicas, apenas que não compreendemos como conseguem ir tão longe: cobiça, poder, inveja, dinheiro. A luxúria de querer sempre a superioridade faz com que alguns “homens” decidam e provoquem guerras. Conflitos armados, sejam eles justificados na fé ou na lucratividade, não são e nem devem ser compreendidos. Indiferente do lugar em que acontecem, ali são perdidas vidas e histórias. Histórias que ficam marcadas pela agressividade e pela arrogância daqueles mesmos senhores que sequer sabem o que é pegar em uma arma.
Não pense você que este é um discurso de pacifista hipócrita; é mais um (desastroso) desabafo diante de um fato. O processo se dá mais ou menos assim: um senhor deseja expandir sua ambição, para isso conclama homens patriotas a lutarem por seu país; estes homens lutam e na luta matam, morrem, ferrem e constroem, então, um novo capítulo na história da nação. O senhor, aquele que concebeu a brilhante ideia, colhe seus frutos e esbanje, glorioso, o vigor de suas astúcias.
Eis a simplista descrição de um conflito armado. Os detalhes dos confrontos, de trajetórias incomuns e de sonhos um dia pensados nem sempre são lembrados. Às vezes ficam apenas na memória daqueles que voltaram. Daqueles que todas as noites sofrem e sentem a sombra do inimigo; que ouvem o ruído inconfundível do tilintar da bala que passa ao lado; que veem no corpo a marca; a dor. Relatos assim chocam e entristecem aqueles que de guerra só ouviram falar. Guerras relatadas em livros como “Gritos da Liberdade”, de James Lee Burke.
A obra retrata a Guerra da Sucessão, nos Estados Unidos, ocorrida de 1861 a 1865, entre os estados do sul e os do norte, motivados pela abolição da escravatura. Como resultado ficaram os 620 mil mortos. Escravos, senhores, coronéis e soldados. Todos marcados, assim como muitos outros que pagam por decisões mesquinhas julgadas por alguns como necessária. Decisões que acatamos e, no máximo, arriscamos um posicionamento mantido até o dia em que baterem em nossa porta com um ofício, solicitando a nossa participação na decisão do futuro da nação. Sim, porque nesse momento fazemos parte de uma nação. Assim como Flower, Willie, Robert e Abigail. As cicatrizes deles estão explícitas no romance, as nossas guardamos, fingindo não existir.

9.23.2009

Elite da Tropa


Há algum tempo perguntamos aqui quanto custava a sua moral. Falávamos, na época, sobre um livro do colombiano Gabriel García Márquez. Hoje, com outra ideia na cabeça, perguntamos: quanto custa a sua honestidade? O que lhe faria corromper uma ordem, um preceito ou um juramento? Perguntas que não precisam ser respondidas. Servem apenas como ponto de partida para discutir algo muito em voga neste país tão carente de “verdades verdadeiras”: a corrupção.
Ela que parece estar em todos os setores e assume as mais diferentes proporções de tamanho e gravidade. Uns a praticam por vício, outros por falta de atenção ou por maldade mesmo. É recorrente vê-la presente na política, no entanto, há um bom tempo o termo vem sendo aplicado em outros setores de organização social, dentre eles a polícia.
A segurança pública é um dos gargalos do Brasil. Parece ser um caso perdido. As pessoas sentem medo e não sabem a quem se dirigir. Na dúvida, aumentam os muros, reforçam os portões e se protegem como dá. A falta de “porto seguro”, antes encontrado no policiamento, leva ao desespero e a desesperança. Não é à toa!
No entanto, a insatisfação não é apenas daqueles que esperam o serviço, mas também de quem o exerce. Integrar órgãos como a PM é hoje arriscado e “ridículo”. E motivos para isso não faltam. Com uma valorização salarial desprezível e um caos instalado fica difícil imaginar que haja idoneidade nas funções (não que isso justifique. De forma alguma!). Você parece lembrar de alguma coisa? Talvez o assunto lhe remeta a um forte grito encabeçado pelo mocinho da novela que, exaustivamente, esbraveja: “Pede pra sair!”. Sim! É exatamente isso.
O livro que deu origem ao filme “Tropa de Elite”, “Elite da Tropa”, organizado por Luiz Eduardo Soares, André Batista e Rodrigo Pimentel, se divide em três partes: na primeira apresenta o retrato de um grupo treinado para a guerra. A guerra diária de uma das cidades mais violentas do país, o Rio de Janeiro. Na segunda a obra esmiúça o desenrolar de um (dos tantos) casos de corrupção e politicagem existente dentro das corporações e instituições. No terceiro ponto, uma justificativa; o desabafo de porque escrever sobre as atividades das polícias e os seus bastidores. No entanto, é à corrupção que o livro direciona a abordagem, mais especificamente à praticada na cidade do Rio de Janeiro.
A “cidade maravilhosa”, vista sob outro ângulo, é apresentada em preto e branco; sem espaço para garotas de Ipanemas, nem bronzeados exuberantes. A “Elite da Tropa” sobe o morro e mata; morre; fere; atira e nem sequer sofre. A eles não é concedido o ato de sentir. Treinados para a guerra, querem mesmo é lutar. Eles fazem parte do BOPE (Batalhão de Operações Policiais Especiais), um dos grupos mais requisitados quando se exigia “trabalho limpo”. Criado em 1978, como máquina de guerra, o grupo era sinônimo de lealdade, credibilidade e violência. Ali os soldados gritavam excitados: “sangue frio em minhas veias, congelou meu coração, nós não temos sentimentos, nem tampouco compaixão”.
E é o relato das atividades desse grupo e tantas outras histórias de vida e de morte que você acompanha em “Elite da Tropa”. Hoje, de acordo com o livro, o BOPE não é mais como antes. Nem poderia. Seguiu a moda dos demais setores. E nós aqui “pedindo pra sair” ilesos dessa história toda.

9.17.2009

Marley & Eu


A cada escolha do livro que irá me acompanhar por alguns dias, muita curiosidade e expectativa são depositadas. E não são poucas às vezes em que elas me proporcionam uma prazerosa satisfação. A cada obra, uma história diferente narrada com variadas interpretações. É um mundo novo visitado a cada semana. A partir dessa edição, essa “visita” me é proporcionada pela parceria com a Livraria Livros & Livros. Desde já agradeço o apoio da livraria e, também, a confiança do Jornal Folha do Alto Irani que, há mais de dois anos, recebem meu trabalho. Trabalho que damos sequência com um livro que já mereceu capas de jornais do mundo inteiro: “Marley & Eu”, de John Grogan.
Há quem o critique de maneira negativa, afirmando ser apenas mais uma obra que remete aos já conhecidos romances hollywoodianos; carregados de uma vida que não existe. E, confesso, quase caí nesse erro também. O livro é sim “romântico”; romântico por que é carregado de carinho; boas intenções e alegria. A cada página é como se o sonho de que existe felicidade se fizesse mais presente; a cada dia junto da família Grogan conhecemos uma outra face da vida: aquela que ainda tem colorido; que tem tempo para caminhadas (diurnas e noturnas); que pensa antes de falar; que surpreende com um carinho a pessoa que se gosta... Com certeza faces de uma vida que (azar o nosso) parecemos ter esquecido.
Esquecemos porque abrimos o jornal, lemos e nos defrontamos com fatos impossíveis de arrancar sorrisos. Esquecemos por que, de alguma forma, nos fazem esquecer. Não que exista algum culpado. Histórias são assim e dizem que cada um constrói a sua da maneira que quer.
Ao ler Marley & Eu redescobri um caminho que pensava não existir mais. E, garanto, isso não aconteceu só comigo. Por isso, arrisco afirmar que é um bom livro. Desses que tiram você do estresse do dia a dia e que te fazem querer esse algo mais que, aos poucos, vamos perdendo. Àqueles que acham clichê, talvez até o seja, mas se for para sorrir (e, por que não, chorar), vale a pena. Talvez precisássemos de mais Marley’s em nossas vidas. Nem que sejam verdadeiros terremotos!




Boa Leitura!

9.11.2009

A lei da vida


Todos são regidos por uma lei. Há quem siga a ordenada por Deus e outros as instituídas pelos próprios homens. Através delas, comunidades são organizadas e passam, então, a ser reguladas em prol de objetivos comuns e coletivos.
Leis são, por assim dizer, normas que seguimos para manter um bom convívio com os outros. Da lei de Deus, além dessa “organização”, busca-se respostas e caminhos espirituais. Já a lei dos homens se detém ao cotidiano.
Acima dessas duas leis existe ainda “A lei da vida”; que dita histórias e a sequência que daremos para as próximas escolhas. Na lei da vida muita coisa pode ser alterada através daquilo que chamamos de destino; porém uma coisa é certa, ela tem início, meio e fim. E disso ninguém pode fugir. Acontece que alguns aceitam melhor esse caminho. Outros lutam e esbravejam pensando poder alterar. Impossível!
A lei da vida é incontestável e inexplicavelmente autônoma. Independe daquilo que queremos, desejamos ou planejamos. No máximo, o que se pode fazer é adiantar algo que é certo na história de todos: a morte.
Para ela que somos preparados e para ela que caminhamos. Às vezes isso parece longínquo e vago. Parece! A morte é fato para todos e por isso causa tamanho estranhamento. (Arrisco dizer que) Não há, além da morte, algo que cause tamanha incerteza na vida do ser humano. Mesmo que tenhamos nascidos para morrer, não aceitamos e tornamos esse ato, comum a todos, como um grande mal; motivo para pesadelo e tormento. Não agimos como o velho Koskoosh. Ele que das vistas não tira mais nada e só escuta ansioso o tempo passar. Ele sabe do seu caminho, sabe de como tudo terminará e não luta. Espera. Paciente se deixa ficar sob a boca de lobos ao lado de um fogo que, pelo frio, já se fez morrer.
Koskoosh, protagonista do conto de Jack London, nos mostra uma realidade que fingimos esquecer. Isso porque também ele não passa de um episódio; assim como todos, um episódio da vida. É por tal razão que passamos e tudo fica. Afinal, se fôssemos tão importantes (ou insubstituíveis) como nos julgamos ser, nada ficaria igual após partimos. No entanto, lá estará o ponteiro do relógio correndo, as nuvens brincando de animais indecifráveis, o vento a carregar as folhas e os maços de cigarros vazios caídos na rua; a comida sendo preparada; os planos de outros construídos; um novo espetáculo a cada segundo. Uma peça que cada um encena como pode. Alguns com mais vivacidade e outros esperando apenas pelo som final; pelo último resquício de frio que o corpo é capaz de aguentar até que, entregue, cumpra o seu verdadeiro papel: morrer.


Boa Leitura!

9.07.2009

Os dons das fadas


Se existe algo que nunca cessará o diálogo, podemos dizer que isso se dá com os assuntos que dizem respeito à satisfação. Poucos são aqueles que sentem-se plenamente (digo, plenamente) satisfeitos com tudo o que tem; que não deixam escapar sequer um ruído de “reclamação” sobre o que lhe acontecem e, ainda, no fim de um dia cansativo expressam aquele sorriso no rosto. Ahhh, como são poucos! São poucos por que são humanos. Desses difíceis de descrever, entender ou explicar.
Desses que diferem daqueles que desejam insaciavelmente conquistar algo e quando o fazem, sentem-se vazios; sem rumo; incapazes de apaziguar os pensamentos inquietos e persistentes. Há quem justifique isso pelo fato de gozarmos mais a busca do que a conquista em si. E não falamos apenas de relações amorosas não. Mas de todas as buscas traçadas diariamente.
Lutamos, todos os dias, para desempenhar um bom papel e, de repente, quando a missão parece cumprida vem vindo uma sensação de que voltamos à estaca zero. Como se nada tivesse sido feito, mergulhamos na incerteza de não saber o que fazer.
Tudo bem, nem todas as pessoas parecem ser assim. Até porque, ao falar de comportamento humano é preciso, sempre, fazer ressalvas. Afinal, cada um foi criado de uma maneira, com limitações e liberdades; oportunidades e necessidades diferentes. Mas de maneira geral, em conversas de bar, emails, msn, pessoas desabafam a angustia de sentir-se assim, sem saber o que fazer quando o entusiasmo se vai.
Há quem sugira que isso vá além da escolha e decisão daqueles que sentem o vazio; como se o sujeito nascesse com ou sem “aquilo”. Como se, ainda pequeninos, recebêssemos um dom que nortearia nossa caminhada. Talvez por isso, Charles Baudelaire fale das fadas e os dons que elas transmitem. Para aqueles que acreditam, a dica é “Os dons das fadas”. Um pequeno conto que, de maneira sucinta, revela um dos dias em que, atordoadas, as fadas estavam terrivelmente atarefadas na entrega dos dons a crianças recém nascidas. Ao término do dia, ainda restava um sujeito que não havia recebido dádiva alguma. Então, a ele foi concedido um dom, pouco usual; desses que se originam na imaginação fértil que só às fadas são permitidos.
O sujeito recebeu-o, até porque um dom é intransferível e impossível de renegar. Aceitou-o. Hoje seu filho carrega por aí a maestria de agradar. Há quantos outros esse mesmo dom foi concedido nunca há de se saber. No entanto, podemos arriscar afirmar que talvez esteja nos dons, então, a explicação para a insatisfação. Quem sabe tenhamos nós recebido a dádiva de ser insaciáveis. Talvez... Talvez, também, tenhamos o dom de nos desiludirmos com falsas explicações e justificativas grotescas transmitidas a canal aberto; sem censura; que bate a porta todos os dias no horário nobre e que nós, tolos, aceitamos porque a isso é que fomos preparados.

Boa leitura!