5.07.2010

Divã


Piadinhas não faltam para dizer que mulheres falam demais. E falamos mesmo! É tanta coisa na cabeça, tanta imaginação, planos, projetos, intenções, tanta, tanta coisa que é difícil não expressar isso em formas de palavras. Maridos, namorados, irmãos e amigos que nos desculpem, mas não há o que fazer. Existe dentro de cada mulher uma necessidade latente de esbravejar a felicidade e lamentar qualquer vestígio de tristeza. E cada uma encontra o seu confidente especial para a tarefa. Mercedes preferiu “falar” com um psiquiatra.
Lopes era o nome dele. Mas do Lopes pouco sabemos. Escutamos mais são as histórias de Mercedes: uma mulher que sente a incoerência e a pluralidade num só corpo; que ora quer descobrir quem é, e ora imagina já saber a resposta; Mercedes quer o amor, o fervor oferecido pelo beijo que aquece; quer o que sempre teve e o que não teve também. Ela sabe que é isso que quer e, então, busca incansável chegar até o fim. A narrativa desta incessante procura acompanhamos (já meio confusos) à cabeceira do Divã.
Escrito por Martha Medeiros, Divã é o relato da vida de Mercedes para ela mesma. Mercedes tão convicta, tão confusa, tão mulher, tão homem, tão carente e tão autosuficiente. “Sou tantas que mal consigo me distinguir”, conta ela ao psiquiatra. “Sou estrategista, batalhadora, porém traída pela comoção. Num piscar de olhos fico terna, delicada. Acho que sou promíscua... São muitas mulheres numa só, e alguns homens também”.
Mercedes também sente medo. Pensa que pode ser traída, e, por receio, não procura; sente medo de não viver intensamente sua vida; medo de deixar os dias passarem sem alterar sua rotina devidamente estabelecida. Mercedes sente medo de ser sempre a mesma e, principalmente, sente medo da paralisação, porque, como ela mesma diz: “Perigoso é a gente se aprisionar no que nos ensinaram como certo e nunca mais se libertar, correndo o risco de não saber mais viver sem manual de instruções”.
Em Divã conhecemos várias mulheres. E cada uma pode ser uma só, ou como Mercedes, ser todas ao mesmo tempo. Por isso, talvez nem todas se encontrem durante os três anos de consulta de Mercedes. Mas, num capítulo ou outro, viramos a página e lá estão também os nossos medos; as nossas angústias, loucuras e tentações. De repente você também se percebe uma Mercedes e aos poucos começa a procurar um projeto para o dia seguinte e, então, aceita o convite que há tempos um amigo lhe fazia; aceita tentar se reencontrar no meio de tantos e-mails, recados, anotações e trabalho; e descobre que a cada dia se constrói um novo momento, onde a repetição que nele acontece é de responsabilidade exclusiva nossa. Mas por hoje chega, já falei demais.


Boa leitura e até a próxima semana!

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