1.21.2009

A viagem do elefante

A maioria dos relatos de viagem, indiferente de quem seja o protagonista, podem seguir dois diferentes caminhos: surpreender ou, e esse é mais trágico e triste, se tornarem “chatos” pelo simples fato de não nos aproximarem dos locais mencionados, como se fossem criados mundos paralelos. Quando essa viagem tem um elefante, bom, daí a história muda um pouco os seus rumos e o “surpreendente” está garantido. Por falar em histórias, quem de vocês leitores conhece o arquiduque Maximiliano da Áustria? Nunca ouviu falar? Então, preste atenção nesse breve comentário, que segue após a leitura de uma “boa história”, carregada de detalhes e peculiaridades, característica de um surpreendente romance, ou conto, como preferir.
Voltando à nossa pergunta, ou melhor à resposta, Maximiliano II é arquiduque da Áustria, recém casado com a filha do imperador Carlos V. A (grande) história desse arquiduque (lembrada e registrada) se passa no século XVI, com início na cidade de Lisboa, em Portugal, quando Dom João III e sua mulher, Catarina d’Áustria, decidiram dar o pobre Salomão (um elefante) a um “compadre”. Salomão havia despertado ínfima curiosidade na sua chegada a Portugal, mas ao longo dos anos caía no esquecimento ao lado de Subhro, o cornaca.
A história dessa viagem, de Lisboa a Viena, José Saramago reconta em “A viagem do elefante”. Relato real, mas que, como comenta o próprio autor, receberam novos elementos descritivos, algumas particularidades e detalhes que da história geral já havia se perdido. É a travessia desse elefante que endossa a mais recente obra do escritor português. Livro carregado de palavras que se entrecruzam e se transformam em poesia, prosa, conto. Durante a viagem, mais que paisagens distintas, nos defrontamos a citações como: “havendo mundo, tudo é possível”, ou “cada um é para o que nasceu, mas há que contar sempre com a possibilidade de que apareçam pela frente exceções importantes”; ou ainda “somos cada vez mais os defeitos que temos e não as qualidades”. É, talvez o autor não nos fale apenas de elefantes...
Mais do que “relatar” uma travessia, Saramago faz considerações sobre a natureza humana e, claro, elefantina. É em uma dessas considerações que o autor comenta a importância de publicidade para pessoas públicas, ainda no século XVI. Ora, se o arquiduque poderia transportar o pobre Salomão (Solimão, como preferir) por vias fluviais, porque fazê-lo em vias terrestres, cansando demasiadamente o imenso animal? “Pensar assim é ingenuidade, ou, no pior dos casos, desconhecer ou não compreender a importância de uma publicidade na vida das nações em geral, na política e em outros comércios”, diz Saramago. Isso porque o desfile de uma grande autoridade acompanhada de um elefante aumenta os números de curiosos e o ibope daquele que o leva. Mas, claro, isso são coisas que só acontecem no século XVI, das quais pouco conhecemos e temos noção.
Quem sabe se alguns dos nossos representantes lessem a obra, seriam acometidos por uma chance ímpar de incorporarem a idéia. Deixariam os aviões de lado, talvez a moda pegasse e, quiçá, nossas estradas seriam transformadas em “tapetes deslizantes”, com pintura, adequada iluminação e fiscalização congruente. Talvez, também, estes políticos pudessem usufruir, assim como o elefante, de um milagre. Porém, para eles seria o milagre da “vergonha na cara”. Mas, que nada, “tudo isso são só palavras, e só palavras, fora das palavras não há mais nada”. 

Boa Leitura!

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