11.18.2008

O silêncio dos amantes



Já disse Bethoven: “Não interrompa o silêncio se não for para melhorá-lo”. Foi nisso que pensei quando comecei a ler o livro de Lya Luft, “O silêncio dos amantes”. Primeiro, porque me instigou o que seria esse silêncio “apaixonado” e segundo porque o que seria melhor que o silêncio? Foi com esses dois pensamentos que passei as 159 páginas de histórias fantasiosas criadas pela autora. São contos de pessoas comuns, pessoas como eu e você, que não entendem nada (ou pouco) da vida, mas que mesmo assim vivem com vigor todos os dias. Pessoas que, por vezes, não percebem o silêncio, aquele que vem de dentro, que apazigua, que eleva.
Foi pensando também nos vários momentos de silêncio que temos que supus existirem várias formas de calar. Há o silêncio tristonho, ofegante, decrépito, apaixonado, esperançoso, momentâneo, incrédulo e perpétuo (e com certeza poderiam ser citados tantos outros). Para cada um deles um lugar, uma feição, um sentimento. Assim, cada silêncio revela uma emoção, ou a falta dela. Mas, antes que o nosso pensamento se perca, a autora lembra: “silêncio demais vira lamento”.
É dessa forma que Lya Luft apresenta histórias de pessoas apaixonadas, ora pela vida, ora pelos filhos, marido, pais e mães. Fala dessa paixão que mantém vivas pessoas felizes. A autora fala também da morte dessas pessoas e foi aí que ative meus pensamentos. Afinal, como parece injusto quando “algumas” pessoas morrem não é verdade? Surge uma raiva, um rancor, algo como inquietação e discordância dessa opinião da qual não somos consultados. Não interessa se éramos pessoas realmente próximas: a morte chega e pronto. Depois dela restam riscos de uma memória por vezes fantasiosas, resta a saudade, a amargura e a nostalgia de “ter ficado”.
Talvez por isso a autora fale tanto em silêncio. Talvez, então, a morte não seja nada mais que um silêncio prolongado. Desses que tememos alcançar e que só sabe quem viveu. Desses onde só “a dor faz parte” e onde os olhos não alcançam. Um silêncio que só quem fica para saber.


“Entre o sim e o não é só um sopro, entre o bom e o mau apenas um pensamento, entre a vida e a morte só um leve sacudir de panos – e a poeira do tempo, com todo o tempo que eu perdi, tudo recobre, tudo apaga, tudo torna tão simples e tão indiferente”. 
Boa Leitura!

O diamante do tamanho do Ritz


Dizem que a primeira impressão é a que fica.... Bom, se assim for tenho mais um vício de leitura: o irlandês Francis Scott Fitzgerald. Os motivos que me levam a esta dedução (ou conclusão) não são poucos: a indicação “conceituada” de quem recebi o livro, a bela maneira como escreve o autor e, simplesmente, por ter um brilho idêntico ao de diamantes (mesmo sem nunca ter visto o mesmo). Por falar em diamantes, até aonde vai a tua ambição? O que faria para proteger um tesouro, o teu tesouro, desses tipo filme de navio pirata? Nós que trabalhamos todos os dias para sustentar necessidades básicas humanas (e algumas coisinhas a mais), para manter aquilo que podemos chamar de “inspiração” ou “amor à profissão” sabemos bem o que é buscar e proteger um tesouro...
Há quem diga que uma pessoa sem ambição não vai a lugar algum. E, como todo mundo vai a algum lugar um dia, poderíamos dizer que essas ambições fazem parte da racionalidade humana geradas por algo como a “loucura química” de que somos acometidos, pela embriaguez divina, e pelo tão natural e simples egoísmo. Diariamente mantemos uma rotina abarrotada de tarefas, por vezes, tempestuosa e árdua. Por isso, o autor sugere em determinado trecho do livro “O diamante do tamanho do Ritz, e outros contos”: “foi um grande pecado a invenção da consciência” e complementa dizendo: “o sono é o refúgio da loucura e insensatez”. Talvez, o que o autor quer nos dizer é que acordados, sonhamos de acordo com nossas possibilidades e limitações e dormindo extrapolamos. Já dizem os psicólogos que o sonho é a manifestação do inconsciente, daquilo que, conscientemente, reprimimos. Confuso? Talvez. Afinal, a vida o é.
Porém, enquanto não temos diamante, sugere Francis Scott Fitzgerald, nos alimentamos de uma embriaguez divina acessível a todos: o amor e a desilusão. Talvez, trabalhemos em intensa proteção do nosso tesouro diariamente, mesmo sem percebê-lo. Porque afinal o que é o nosso tesouro? Falamos apenas de dinheiro ou entram aí ideais, planos, memórias e recordações? É, quem sabe, guardemos nós também um tesouro ao qual protegemos diariamente.
É assim, como se estivesse protegendo um tesouro, que o autor nos apresenta três contos. Em cada um deles uma história distinta e instigante. Dessas que nos fazem dormir tarde e acordar cedo para terminá-las de uma vez só. Dessas que nos fazem sentir a vontade de comprar (ou ler) todos os livros do autor. É, talvez seja essa a minha ambição. E a tua, conseguiste descobrir ou irá esperá-la no próximo sonho?
Boa Leitura!

10.30.2008

A incrível e triste história da Cândida Erêndira e sua avó desalmada


Muito se fala em consumismo, marca e o valor que damos a ela. Não são poucas às vezes que pagamos caro por ela (e em muitos casos é só por ela mesmo!). Falando em pagar caro, qual o maior valor que você investiu em algo ou qual a sua maior dívida? Quantos foram os dígitos que por dias te atormentou e o levou à lotérica (ou qualquer banco) para saldar a conta? Talvez seja melhor nem lembrar... É claro que esse cálculo (de o que é bastante ou pouco) depende da condição social e do poder aquisitivo de cada um. Mas e sua dignidade, por quanto venderia? Sem preço? A de Cândida Erêndira custou um dia de cansaço, equivalente a 872.315 mil pesos.
No caso de Erêndira, dignidade tem preço sim, mas este pode variar de 250 a 50 pesos, dependendo da proposta do comprador. Quem é Erêndira? É a bastarda de 14 anos criada por Gabriel García Márquez em “A incrível e triste história da Cândida Erêndida e sua avó desalmada”. Essa bastarda (que azar!) teve a infelicidade de, após um dia exaustivo de trabalho, deixar queimar toda a fortuna de sua avó (desalmada). Sem outro recurso, paga com a única coisa que tinha passível de venda: o sexo. Mas calma lá! O livro não é pornô gente! O que o autor nos fala é que, sem perceber, aos poucos Erêndira vendia mais. Vendia sua esperança, sua juventude e, principalmente, vendia aquilo que caracteriza a todos como seres humanos. Com isso ele nos faz pensar: será que também ela se tornaria desalmada como a avó?
É assim, dando nó na cabeça, que Gabriel García Márquez nos apresenta mais uma história. Destas que nos fazem pensar, delirar sobre o que nós mesmos fazemos, ou deixamos de fazer. Pensei, por exemplo, até que ponto somos capazes de “nos vender” ou, ainda, qual o preço de nossa vida? É possível perceber isso em números? Não sei, assim como não sei precisar de um todo o que quis nos dizer o autor. Afinal, até que ponto temos preço, somos nós também desalmados? Desalmados, de acordo com definição do dicionário Michaelis, significa “desnaturado, desumano, perverso; que não tem consciência; que mostra maus sentimentos”. Pensando bem, acho que realmente não somos desalmados. Egoístas, mesquinhos, complacentes, narcisistas, talvez. Quem sabe até gulosos e insensíveis. Mas desalmados não! Não é porque não damos a mínima às questões ambientais, ou porque pensamos apenas no dinheiro (lucro, compras), beleza, fofoca, nem tão pouco por desacreditarmos em outro modelo econômico, na paz do mundo (incluindo o Iraque...). Não é por nada disso que seríamos considerados desalmados. Isso não! Talvez bárbaro seja a palavra certa. Por enquanto, sem definição exata, fazemos de conta que o problema (que problema?) não é nosso. Assim é mais fácil. Resta mais tempo para falar do futuro (que futuro?), dos nossos planos (econômicos) e nossos objetivos. Pensando só em nós mesmos o trabalho é menor. Assim somos mais felizes e de almas puras (e não desalmados!).

Boa leitura!

10.22.2008

Ninguém escreve ao coronel


Por quanto tempo és capaz de esperar?
Qualquer tipo de espera, seja em consultório, terminal rodoviário, sofá de casa, fila de banco, carteira escolar, à frente de um computador, demora! Quando esperamos por coisas que sequer sabemos se virão, pior ainda. Quer dizer, mais agoniante ainda. Às vezes esperamos por um telefonema. Outras esperamos aquele amor bonito, perfeito, sem brigas... Esperamos o emprego dos sonhos, o filho quietinho, o salário aumentar, mas também esperamos por algo que agora não me vem o nome. Aquilo que nos faz levantar todos os dias, olhar para frente e encarar tudo com o mesmo jeito esperançoso e confiante de sempre (exceto os dias em que o “pé esquerdo” prevalece). Sem saber se realmente vamos ter algo de diferente, esperamos. Esperamos por aquilo que nem sabemos se existe.
No meio de tanta espera surgem alguns acontecimentos inesperados. Estes, por vezes, nos surpreendem de maneira positiva (a amizade feita no ônibus e que dura muito mais que uma viagem, o bate-papo que vira desabafo, o email desconhecido falando sobre algum trabalho que nem lembramos mais ter desenvolvido...). Outros, ah! Esses são melhor nem lembrar.
Talvez, em um curto raciocínio, possamos chegar à ínfima conclusão de que é na espera que vivemos, mesmo sabendo que “a única coisa que chega é a morte”. É o coronel foi duro ao nos falar da morte. Porém, mais dura ainda é a espera dele, do coronel de que nos conta Gabriel García Márquez, em “Ninguém escreve ao coronel” (no título original: “Coronel no tiene quien le escriba”). Todas as sextas-feiras ele vai até o porto e espera. Passam-se décadas e ninguém escreve ao coronel.
O que o coronel espera que lhe escrevam o autor não descreve em apenas uma linha. Isso nos leva a pensar que talvez ele espere apenas por uma boa notícia como a aprovação de sua aposentadoria, um novo lance de valor para o seu galo, o resultado de uma loteria que ele nem sequer apostou, ou simplesmente ele espere que lhe escrevam. Pouco? É, pode ser que pareça pouco diante da grande miséria em que vive o coronel. Mas talvez tenhamos que sentir esta pobreza para pensar no que nós esperamos que nos escrevam. Ou ainda (e isso é só um devaneio) talvez seja simplesmente para nos fazer pensar em como esperamos. Incrédulos, apáticos, mesquinhos, covardes, ou como o coronel: esperançosos e confiantes. Talvez também eu tenha esperado muito para dizer tão pouco ou, quem sabe, dizer quase nada. Mas enfim, o que ficou foi o pensamento de que é preciso esperar com fervor, determinação e, é claro, sem pressa. Talvez, a espera seja mais profícua.
Boa Leitura!

9.30.2008

Ensaio sobre a cegueira



Diariamente abrimos os olhos e vemos. Vemos ao nosso lado o filho que desfruta o sono profundo, o namorado a acordar, o relógio a apontar as horas, vemos o dia claro, escuro, chuvoso, quente, frio. Vemos a janela bater, as folhas caírem... O que tem de mais nisso? Aparentemente nada, afinal, todos, sem distinção de raça, credo ou gênero podem aproveitar este gozo da vida (a parte aqueles que por algum motivo perderam a visão). Por ser tão naturalmente praticado que o “poder” da visão nem sempre é tido como algo realmente glorioso. E, assim, vamos usufruindo desse bem.
Somos dependentes da visão para o desempenho de simples tarefas, como a leitura de um livro, por exemplo, virando página por página, atentos a informação de cada linha. Mas, e se de repente fossemos acometidos por uma cegueira repentina?! Tudo bem, sei que a probabilidade de isso acontecer é, praticamente, nula. Mas pense! Se, de repente, está você a ler um livro (como o fiz recentemente) e, sem mais nem menos, surgisse uma “treva branca” em sua frente. Ou tomando banho, levantando-se da cama para arrumar o café, na rodoviária a espera de um amigo, ou no carro, em frente ao semáforo que até o momento estava vermelho impedindo a tua passagem e que você, pacientemente e rotineiramente, espera passar à luz verde. Se nesse momento tudo sumisse dos teus olhos e visses apenas uma luz branca. O que faria? É este o afrontamento que nos coloca o brilhante escritor português José Saramago, em Ensaio sobre a Cegueira. De repente, na cidade inventada por Saramago ninguém mais vê. Tudo começa aos poucos, um ou outro caso isolado de cegueira. O desespero no início aflige apenas os “amaldiçoados” que perderam a visão e logo se espalha a praticamente todos os outros moradores da cidade. Cegas, essas pessoas precisam redescobrir o mundo. Mais do que isso precisam se reconhecer sem a imagem refletida no espelho. Confesso, e muitos leitores hão de concordar, que a angústia surge como algo natural em meio às páginas. Como se fosse nós mesmos, tentamos tatear, sentir, ouvir e perceber as coisas que à visão já não cabe. Angustiamo-nos porque pensamos que poderia ser conosco. Poderíamos nós estar ali, sem ver, num mundo novo e incerto. Embora o auto alerte que “só num mundo de cegos as coisas são como são”, temos medo. Medo do que está a nossa frente que não conseguimos ver. Em entrevista a algum jornalista o autor diz: “Este é um livro francamente terrível com o qual eu quero que o leitor sofra tanto como eu sofri ao escrevê-lo. Nele se descreve uma longa tortura. É um livro brutal e violento e é simultaneamente uma das experiências mais dolorosas da minha vida”. Se a intenção era nos fazer sofrer, mais uma vez o conseguiu o autor. Mas não sofremos apenas pela possibilidade de, talvez, sermos nós os próximos a cegar. Sofremos pela maneira grosseira que levamos a vida e, principalmente, pela semelhança que temos com eles, os bichos. Bichos que matam para comer. Seres capazes de tudo pela sobrevivência. É esse homem sujo e nojento que conhecemos. Mas, além disso, o autor fala que “cegueira também é viver em um mundo que tenha acabado a esperança”. E afinal, se somos todos cegos, qual foi a última coisa que vimos? Qual foi a última rua pela qual passamos? O que guardaremos para sempre na memória? Ou será que somos nós também cegos que mesmo vendo, não vemos?

 
Boa Leitura!

9.25.2008

Lembrança de velhos


Que o tempo passa muito rápido, não há dúvida, acho até que estou me tornando uma chata no assunto, tamanha a inquietação em “não ter tempo pra nada”. Passamos dias e até meses sem perceber a nova ruga adquirida no rosto, o convencionismo de que “sempre foi assim” e então é melhor não arriscar, a apatia diante de alguns assuntos... Enfim, levamos um susto ao olhar para o calendário e perceber que, por falta de tempo, nem a paginazinhas foram viradas. Nesse momento temos, então, a nítida noção de quantos dias passaram e quantos ainda faltam até o “ano novo”. Um pouco de susto, um pouco de medo são naturais neste instante, mas continuamos.
Por falar em tempo, que idade você tem? 14, 19, 21, 28, 33? Nenhuma das datas apresentadas? É, não ando muito bem no “chute”. Mas, te pergunto a idade para questionar qual a imagem que você tem de “velhos”? Cabelos brancos, memória fraca, sabedoria, bons conselhos, pensamentos antiquados? Como você percebe pessoas velhas? Provavelmente tenha uma distinção de alguém com 25 anos, por exemplo. Mas o que é?!!
A palavra velho simboliza, dentre tantas outras coisas, uma pessoa que viveu muito e que tem história para contar (seja ela atrativa, ou não). Estas histórias são narradas ao redor do fogão à lenha, em uma noite que a TV, o rádio e o computador são esquecidos, ou em um dia com a família reunida. Mas, histórias assim também podem ser contadas em livros. Tudo bem, não terá o mesmo calor que emana do fogo, mas a intensidade com que é narrada se assemelha, e muito, às histórias da “vovó”. Um exemplo: “Lembranças de Velhos”, de José Luiz Zambiasi. A obra traz cinco histórias distintas de imigrantes descendentes de italianos, oriundos do Rio Grande do Sul, com destino ao Oeste Catarinense com intuito único de construírem as suas trajetórias de vida.
O livro apresenta de maneira simples um pouco da história de luta, coragem e força desta gente e se diferencia de tantos outros que tratam do período colonizatório da região através dos depoimentos destes “velhos”. Com eles a história ganha vida, cor, forma e deixa de ser apenas um período no passado. Com os depoimentos, o autor os deixa ativo nos relatos e nos faz pensar na memória que temos e nas histórias que um dia vamos contar. Se é que temos alguma, afinal o tempo passou tão rápido que, por vezes, fazemos apenas aquilo que somos “obrigados”, sem tempo pra historinhas. Talvez, foi pensando nisso, e chutando melhor do que eu, que o autor coloca que nos situamos, cotidianamente, entre o ato de lembrar e o ato de esquecer. Entre versões oficiais de nossa vida e o nosso desejo de como ela deveria ser. Entre o que fizemos, o que pretendíamos ter feito e o que continuamos a fazer. É entre tudo isso que está a nossa vida, marcada por situações bizarras, cômicas, trágicas e normais, que podem até (imaginem só!) virar uma história no futuro.

Boa leitura!

9.17.2008

Crônica de uma morte anunciada




O ser humano é por si só insatisfeito. Busca sempre mais, e de variadas maneiras. Nunca nos contentamos com o almoço do dia, o elogio do chefe (ou do namorado). Como diz a música: queremos sempre mais. Esta busca insaciável também nos torna inconstantes. Nunca somos os mesmos, porque nossos objetivos também não são. Claro, não falo aí das posturas adotadas como empregado, “patrão”, líder, mas sim de nossa inconstância psíquica e emocional. Desenvolvemos nossas atividades rotineiras tal como devem ser feitas. À noite paramos para pensar e nos vem a sensação que nada foi feito. Por quê? Arrisco uma resposta: porque, na maioria das vezes, não fazemos aquilo que gostaríamos de fazer. Fazemos o que DEVE ser feito. E, como os dias passam depressa, em alguns momentos somos até incapazes de perceber isso. Deixamos então, ao inconsciente que “cuide” do nosso desejo recalcado e continuamos.
A falta de tempo é, além de uma boa desculpa quando não se quer visitar a sogra, um prejuízo à criatividade e à emoção humana. Olhamos nossa lista de coisas a fazer e comparamos com o tempo: deixamos de lado o livro e o CD, também a viagem e a visita ao velho amigo (mesmo porque o dinheiro está curto). Fazemos o que é realmente necessário. Mas e se, de repente, você soubesse que morreria amanhã? O que você faria nas próximas 24 horas?
Como exercício, tentei pensar em algumas coisas. Se não for parecer petulância, sugiro o mesmo a quem lê esta resenha. Então, em meio aos meus devaneios “decidi” que se morresse amanhã acordaria mais cedo, veria o nascer do sol, encontraria pessoas distantes, falaria o que está engasgado na garganta, faria coisas que nem sequer posso imaginar, enfim, faria tudo o que fosse possível para não partir desta para uma melhor sem ter aproveitado um pouquinho. O sentimento é de desnorteio. São tantas coisas que não consigo citar mais que estas. Talvez, os leitores tenham encontrados muitas outras “atividades” para este dia fúnebre e definitivo. E, somente talvez, isso seja uma prova de quão somos mesquinhos com nossas vidas. Porque pensar em “coisas assim” somente próximo ao fim? Ok. A resposta já surgiu: precisamos trabalhar, cumprir funções e obrigações, em suma, devemos dançar conforme a música. E, pensando assim, até que seria bom se tivéssemos alguém que nos falasse desse dia. Alguém que nos dissesse: “aproveita que amanhã não tem mais”, talvez assim, a nossa listinha de “afazeres” diminuiria. Mas, talvez tenhamos o mesmo azar que Santiago Nasar e percebamos a morte perto demais para que seja possível fazer algo de diferente. Quem é Santiago Nasar? Ele é aquele que todos sabiam que iria morrer, mas que não tiveram coragem de avisar. Ele é o personagem criado por Gabriel García Márquez em “Crônica de uma morte anunciada” para nos chamar a atenção de que nem sempre somos informados de coisas assim, relevantes. A morte dele foi anunciada para quem quisesse saber. Apenas ele não soube o fim que teria. Gabriel García Márquez nos avisou, e agora?


Boa Leitura!

Retratos de exclusão


Nada como ter liberdade. Poder decidir o que quer e o que não quer. Sentir o gostinho de decisão nas pequenas coisas, realmente, é extasiante. Este “poder” de decidir nos torna mais astutas e influentes, mesmo que a resolução a ser tomada diga respeito apenas a nós mesmos.
Ok! Até aí o relato (desabafo?) não trouxe novidade alguma a estas poucas linhas. Por quê? Porque tudo vai muito bem até o momento em que passamos a decidir pelo outro. Tanto faz se na vida a dois, três, quatro, ou o escritório inteiro. Decidir por outra pessoa é tornar obsoleto o sentimento de “liberdade” acima mencionado. É anular vozes que surgem ao nosso redor. Poderia até dizer que é “etnocentrismo puro”, se é que a expressão existe.
Isso, sem falar no julgamento. Ahh, como somos severos, por vezes até carrascos conosco, com amigos, irmão, pai, mãe, etc.. Somos peritos em julgar, dar sentenças e prever punições. Punições estas que, é claro, indicamos conforme a “atrocidade” que nós (puros e sábios) julgarmos incoerentes. E, em alguns momentos, quando percebemos fomos longe demais. A tendência é que estes julgamentos piorem quando tratamos de algo desconhecido, ou algo que tenha um forte grau de preconceito. Exemplo? HIV/Aids.
A doença existe há três décadas. No início, era conhecida como “peste gay”, por ter sido detectada em homossexuais americanos, sendo a ser considerada uma punição por tal prática (eis o JULGAMENTO). Na década de 90, a doença esteve associada à promiscuidade ou ao convívio de situações de risco, como o uso de drogas injetáveis e o compartilhamento de seringas.
Cansado de ouvir falar em HIV/Aids? Então, preste atenção nos dados abaixo e pense, realmente, se este é um “problema” penas de quem tem o vírus.
De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, cerca de 40 milhões de pessoas possuem a enfermidade, das quais 20 milhões já morreram. A cada segundo acontecem 14 novas infecções. As mulheres representam 43% do universo de adultos. Desde o início da epidemia, mais de quatro milhões de crianças com menos de 15 anos já adquiriram o vírus em todo o mundo. Acrescentamos a esta lista, os familiares e a rede de convívio de pessoas com a doença, que de alguma forma sofrem com os seus reflexos.
Como pôde ser observado, são muitas as pessoas envolvidas pelo vírus. E, foi para da um “chacoalhão” no preconceito relegado a estas pessoas que, em 2004, Silvia Regina Mendes lançou “Retratos de Exclusão”. Trabalho que faz uma síntese da história da doença, da criação do Grupo de Apoio e Prevenção à Aids de Chapecó, Gapa, em 1985, e, mais ainda, sobre a discriminação aos portadores da doença. Para isso, Silvia usou de depoimentos de pessoas que convivem com o vírus, familiares e voluntários. Se a intenção era chocar e emocionar. Funcionou.
Talvez, lendo o livro possamos ter uma vaga idéia do que um pré-julgamento pode causar na vida de uma pessoa. Aqui foi citado o caso de HIV/Aids, mas quantos outros julgamentos terão de ser feitos até que respeitemos a diferença, escolhas, modos e vida enfim, até que respeitemos a vida dos outros?

“É muito fácil falar de preconceito, mas muito difícil ser vítima dele. Para saber o que se passa, é preciso ser um paciente e carregar no sangue o estigma de uma doença, cuja única certeza é ter que conviver com ela até a morte”, Silvia Regina Mendes.

 
Boa Leitura!

9.11.2008

...

"Me busco em músicas que dão ritmo ao que sinto de forma silenciosa, e me busco em trechos de livros que revelam idéias que mantenho ainda embaralhadas... Então, escrevo e me busco em frases feitas e frases inventadas, colocando uma palavra atrás da outra na tentativa de construir uma lógica, um atalho, uma emoção que eu consiga sustentar e repartir. Depois que fecho o computador me busco no sono, nos sonhos, no inconsciente, no meu lado noturno, sombrio e, por vezes, perco a coragem e tudo me amedronta, a começar pelo fato de que o dia terminou e a busca não se encerrou, nem irá, porque esse tipo de busca não se encerra", Martha Medeiros.

9.04.2008

O livro dos sustos



Falamos sobre a correria diária, os trilhões de coisas que temos para fazer, as promessas que insistimos em mencionar tentando administrar o tempo (algo como: ler o livro comprado há dois meses, enviar aquele email ou fazer uma ligação a um amigo de longa data, enfim, promessas não nos faltam), mas pouco falamos sobre nossos medos. Talvez, por medo de que eles se tornem mais poderosos, ou, talvez, porque nem para isso mais tenhamos tempo. Talvez...
Pensar nos medos apenas quando os sentimos. E por falar em o sentir, abro a porta do banheiro e lá está ela: poderosa, astuta, pronta para a guerra. Quem? A dona barata. Ah, quantos tipos diferentes de pavores me causa aquela coisa que ora voa, ora é rápida, ora anda em círculos (ou em qualquer direção). Ela que é ágil o suficiente para fugir sem que eu me de conta para que lado ela foi, o que, na verdade, não muda muito, já que após este encontro, encosto a porta do banheiro e evito o máximo possível precisar daquele cômodo da casa.
Mas, o que tem a ver a barata inoportuna da minha casa com o medo que propus nas primeiras linhas? Num primeiro olhar, apenas o objeto que nos leva a este sentimento. No entanto, se nos deixarmos levar por 05 minutos de flerte percebemos que surgem mais alguns elementos, como por exemplo, o fato de deixarmos de fazer alguma coisa por medo de que não dê certo, de não agradar as pessoas ao nosso redor, medo da frustração, medo de não conseguir fazer, aprender, ou ensinar. Medo de magoar, temos medo até de ser feliz (se para isso for preciso ousar muito além do que costumamos fazer, então, nem se fala). Isso tudo sem falar nos medos da nossa infância: bicho papão, o monstro embaixo da cama (ou dentro do armário), alienígenas, vampiros, múmias, barulho da máquina do dentista, cães brabos, e uma série de outros temores que são brilhantemente descritos na obra infantil de Rosana Rios, “O livro dos sustos”. Foi ao ler sobre estes medos que lembrei de tantos outros. Medos de gente grande? Não sei. Sei apenas que hoje eu ri lendo o livro e pensando em como temia por tudo aquilo. Isso me faz pensar se daqui a algum tempo também darei boas risadas dos meus medos atuais. O que, de certa forma, preocupa, porque me faz pensar que o medo sempre existirá. E isso não me agrada. Mas, talvez, como proponha a autora ao falar de “medos infantis”, devamos enfrentar estes medos para aniquilá-los. Para isso, uma boa dose de coragem e talvez um pouco de audácia ajudem. Afinal, se conseguíamos quando criança, porque não pegar o inseticida e sair às catas da senhora barata. Talvez funcione!

Boa Leitura!

8.27.2008

Coisas da vida


Os dias passam de pressa. Não nos questionam sobre quantas coisas queremos e precisamos fazer. Eles têm exatamente 24 horas. E temos 24 horas para trabalhar, dormir, comer, ser simpática, bem humorada, relaxar, ler um livro, estudar, dançar, namorar, viajar, conversar com os amigos, tomar um chimarrão (um café, ou uma cerveja), ir ao banco, pagar as contas, fazer outras e até ficar sem fazer nada. Ufa! Pouco tempo para tanta coisa... Então temos que escolher apenas algumas delas e deixar outras para as próximas 24 horas. E o que escolhemos? Primeiro as obrigações relacionadas a prazos, é claro, porque embora exista a máxima de que brasileiro deixa tudo para última hora, alguns, e não são poucos, mantém com firmeza os prazos estabelecidos por outros que também têm prazos a cumprir.
Voltando ao assunto, afinal o tempo urge, realizamos atividades que estejam relacionadas às obrigações diárias. Trabalhamos e continuamos com nossos afazeres. Nosso escape é o sono. Este sim pode ser reduzido para que outras coisas possam ser feitas. Reduzindo o sono, reduzimos também os sonhos, sejam eles profanos, delicados, imorais ou até mesmo desprezíveis. Reduzimos nossa capacidade de sonhar e nos permitimos cada vez menos a extrapolar e fugir das regras. Buscamos apenas o certo, em oposição do errado, sem perceber que existe todo o resto.
Neste “todo resto” estão as delícias, os abraços, beijos, carícias e uma infinidade de outros sentimentos. No entanto, é neste todo resto que estão as coisas que deixamos para outro dia. Torcemos, então, para esse dia realmente chegue e assim possamos voltar a sonhar, afinal, devaneios são agora luxo de quem consegue organizar o tempo e definir ele próprio a sua rotina, sem perder os prazos, nem os amigos e muito menos a namorada.
O tempo passou tão rápido que nem percebi que deveria apenas falar do livro que me levou a delírios como esse, em um dia que a pressa coordena minhas atitudes. E afinal, qual é o livro? Sim. “Coisas da vida”, um livro de crônicas de Martha Medeiros. Uma ótima pedida para quem deseja distrair e parar um pouco para pensar em coisas “fúteis”, como a nossa influência no cotidiano, ou vice-versa.

Boa leitura!

8.20.2008

Devaneios...

"O amor é certo,
o ódio errado e o resto
é uma montanha de outros sentimentos",
Martha Medeiros.

Memórias de minhas putas tristes


Aniversários geralmente são dias de festas, presentes e muita alegria. Geralmente! Há também os aniversários carregados de nostalgia, desassossego, inquietude e, às vezes, frustração. Cada um concebe este dia de formas bem particulares, ou conforme o estado de espírito em que se encontra. Agora, multipliquem estes presentes, estas festas, a nostalgia e a frustração por noventa anos. É isso que faz o célebre Gabriel García Márquez em “Memória de minhas putas tristes”.
“Também a moral é uma questão de tempo”, alerta o autor ao narrar a primeira (e única?) história de amor do cronista e professor aposentado. Este que, no dia do seu aniversário de 90 anos, resolve se dar de presente uma noite extasiante com uma virgem. Foi a partir do insólito telefonema à velha conhecida Rosa Cabarcas que surge uma nova vida “numa idade em que a maioria dos mortais está morta”. E, após acertadas algumas formalidades, só restava esperar que a noite chegasse para degustar. Surgia com a noite um desejo cada vez mais intenso e perigoso. O encontro aconteceu. Ela dormindo, ele trêmulo pelo desejo de vê-la ali, desprotegida e pura. Na memória, ficou aquele corpo transpirando desejo e sedução. No corpo a sensação de “quero mais”.
Levado por um princípio que nem ele mesmo consegue explicar, este ‘senhor’ nunca se deixou apaixonar. Nunca se permitiu sentir aquela ansiedade antes de algum encontro, as noites mal dormidas pensando no outro, os desejos e a inquietude que só o amor consegue fazer. A isso ele nunca se entregou, até o dia em que conheceu Delgaldina. O fruto vivo da imaginação. Lá estava ela desde o seu aniversário, sempre a espera. De olhos fechados e corpo a mostra. Perfeita amante!
O desejo dessa conquista traz cor ao mundo criado por Gabriel García Márquez, que lembra sem perdão: “os fatos reais são esquecidos, mas também alguns que nunca aconteceram podem estar na lembrança como se tivessem acontecido”. E, assim, como algo incerto, Degaldina transforma este velho amante. Sem palavra alguma, nem mesmo uma carícia, provoca o nascimento de um outro homem.
Degaldina o fez perceber que “o sexo é o consolo que a gente tem quando o amor não nos alcança”. Ah! O amor! Sentimento capaz de nos revelar um mundo cheio de graças, delicadezas e também ciúmes. Amor impalpável e desconhecido. Amor capaz de criar personagens e colocá-los em nosso caminho sem consulta prévia. É sobre esse amor que o autor nos diz: “por mais que lidemos com esse sentimento como se fosse um paletó dois números acima do nosso, apenas ele e tão somente ele, o amor, nos faz humanos”.
E, não importa a idade que tenhamos, o amor se aconchega ao nosso lado e fica. Fica a espera de um minuto de atenção, um momento em que possamos perceber tantos “perfeitos amantes” dispersos e sozinhos pelo mundo. Talvez, não seja preciso esperar nossos 90 anos, mas se assim tiver que ser que seja sem pudor.

Boa Leitura!
“A gorda do Tiki Bar”

Provavelmente muitos leitores, assim como eu, já riram sozinhos enquanto se deliciavam com algum livro, indiferente do lugar onde a leitura era feita. Mas, quem destes leitores já sentiram a face esquentar, ocasionando o temido e inconveniente rubor por ler algum livro “excitante”?
Para aqueles que não experimentaram esta situação e não perdem uma boa oportunidade a dica é “A Gorda do Tiki Bar”, de Dalton Trevisan. Uma série de contos carregados de amor, desejo e erotismo. Sem meias palavras o autor descreve sentimentos provocantes e sedutores; pensamentos ousados e peculiares.
São histórias vividas por pessoas com diferentes idades, diferentes profissões e diferentes desejos. Mas, estas pessoas são ligadas por uma mesma intenção: aproveitar vontades que surgem sem hora certa ou lugar adequado. Afinal, desejo que é desejo não pede permissão, nem autorização para chegar. É este desejo louco e destemido que Dalton Trevisan descreve de maneira caricata e extasiante. E quando menos percebemos, lá estamos nós com as mãos nas bochechas tentando disfarçar a mudança de cor.
O livro é capaz de levar a pensar se para viver é necessário fazer algumas loucuras, conhecer muitas pessoas, ou simplesmente imaginá-las da maneira que bem entendemos, sem peso na consciência. Estas inquietações, da maneira como são descritas pelo autor, revelam um sentimento impregnado nos pensamentos de cada indivíduo que varia apenas na maneira como são manifestados. Pela perspectiva presente no livro, um dia ou outro este sentimento aparece voraz, tentador e insaciável, tal como surgiu na vida dos personagens.
E, como se o autor estivesse atento ao nosso “deslize” no exato momento em que nos deleitamos num desejo pervertido e louco, as cenas são descritas sem censura. Para não deixar dúvida. O livro é objetivo, claro e direto. É essa característica do autor que faz a obra se diferenciar. Quando pensamos que o autor vai fantasiar uma cena ele chega de supetão e pronto. Está tudo ali, descrito nas páginas e seguidas de algumas ilustrações. Não importa se com a professora, com a bela menina de 15 anos ou mesmo com a Gorda do Tiki Bar. De alguma maneira e em algum momento esse desejo surge em cada um, basta o sentir.
Para aqueles que aceitam um desafio fica a dica. E, se preferirem, deguste o livro em pequenos goles, assim despertará ainda mais a imaginação e garantirá por mais dias avantajados rubores.

Boa Leitura!
“Pequenos delitos e outras crônicas”

Nada de romance, nem tragédia. Esta semana o Guia do Leitor traz o bom humor em primeiro lugar com “Pequenos delitos e outras crônicas”, de Walcyr Carrasco.
O livro é a resultado da junção de 66 crônicas publicadas pela revista Veja São Paulo (2004) e fazem um apanhado geral do cotidiano. Desde o “truque do assaltante” ao “turista de imobiliária”, ou de “promessas angelicais” aos “pequenos delitos” cometidos diariamente por todo cidadão que se preze. É essa característica, de tratar de coisas simples do dia-a-dia (como faxinas, compras em supermercados, um final de semana com amigos, dar ou não gorjeta, etc) que fazem do livro encantador e divertidíssimo.
“A imaginação ainda é a melhor arma para enfrentar as dificuldades da vida moderna”, coloca Carrasco. E, é através dessa imaginação que o autor nos faz pensar e ilustrar cada ação, cada passo, cada atitude descrita. Em tom irônico, ou com um toque de nostalgia e muito sarcasmo, Carrasco revela um mundo de comédia em cada tragédia.
“Surrupiar um queijinho no supermercado parece não ter sequer importância. Mas os pequenos delitos, quando somados, tornam a vida na cidade grande ainda mais selvagem”.

“Pornopolítica”

Quem não sente saudade de um tempo que às vezes parece remoto? Ou quem não lembra com carinho das coisas vividas no passado? Lá, no tempo que ficou, tudo parece perfeito. Algumas falhas até podem ser percebidas, mas ahhh o passado, “esse não volta mais”.... E, é relembrando o passado que Arnaldo Jabor se mostra nostálgico e sem esperança com o presente e futuro (se é que ainda sonhamos com algum) em Pornopolítica: paixões e taras na vida brasileira, lançado pela editora Objetiva em 2006.
Ao falar da extraordinária capacidade humana de absolver atrocidades e, ao mesmo tempo, atear fogo em bruxas em plena praça pública, Jabor comenta, na crônica “Uma noite de sexo que mudou o Ocidente”, o caso de Bill Clinton e a estagiária Monica Lewinsk. A resposta (moralista e conservadora) que o acontecimento teve se contrapõe ao silêncio (quase sagrado) frente às atrocidades e loucuras de Bush. E, é esta espantosa divergência de reações tidas pelo ser humano que choca e 'paralisa' Jabor.
Assim, sem papas na língua, Arnaldo Jabor nos deixa estarrecido com sua imensa capacidade de falar aquilo que estávamos pensando, mas que por algum motivo não nos dispusemos. Tal como a frase: “A gente só vai para o céu que acredita”, ou “A derrota é um grande momento de verdade. Só diante da vergonha que entendemos nossa miséria. Num primeiro momento, queremos encontrar uma explicação para o fracasso, mas o fracasso não se improvisa – é uma obra calculada, caprichada durante meses, anos até”.
Não importa se falando de futebol, a saudade de um futuro planejado e que não chegou, ou da horrenda situação política do país, Jabor se coloca estarrecido, tal como no trecho abaixo:
“A crise nos ensina a ver a verdade de cabeça para baixo. Ensina que a verdade é o contrário de tudo que dizem os depoentes, testemunhas e réus. A verdade é tudo que os políticos negam”.

“O linchamento”

“O Linchamento - que muitos querem esquecer”, lançado no ano de 2003, revisado e ampliado em 2007 pela editora Argos, apresenta a história de uma cidade que, de um lado, tinha 200 pessoas clamando por “justiça” e pela preservação de seus valores e, de outro, quatro homens a espera de uma única decisão, sem direito a resposta, nem ao menos a defesa.
Escrito por Monica Hass, “O Linchamento” narra a história oficial e, também, a história não-oficial sobre o linchamento (espancamento e morte) de quatro homens na cidade de Chapecó no ano de 1950.
Presos por perturbar a tranqüilidade da então pacata cidade e por atear fogo à Igreja local, Ivo de Oliveira Paim e Romano Ruani, juntamente com os irmãos Orlando e Armando Lima, foram condenados não pelo poder judicial e seus representantes, mas pela população local. Segundo a autora, existia entre os moradores “uma predisposição em fazer justiça com as próprias mãos”, pois assim acreditavam defender os padrões comportamentais e normativos até então estabelecidos e, por isso, classificaram (e muitos ainda classificam) como “justo o crime cometido”.
Na noite de 18 de outubro, Chapecó se fez conhecer nacionalmente por meio de um ato vergonhoso de violência. Organizado por um grupo de pessoas, os chapecoenses invadiram a prisão local e, com golpes de paus, facadas e tiros, mataram os quatro homens presos. Depois, os arrastaram para fora da cadeia e atearam fogo nos corpos estendidos ao chão.
Este ato até hoje é pouco comentado na cidade. Seja por vergonha de algumas pessoas ou pelo fato de envolver figuras de nomes conhecidos e importantes. É também por isso, que a obra de Monica Hass se torna ainda mais contagiante e estarrecedora. Este é um livro que choca e revolta muitos dos seus leitores, principalmente porque o fato narrado aconteceu aqui, na cidade de Chapecó.
Conforme trechos do livro, “as motivações de um linchamento, quando as pessoas, carregadas de ódio ou medo punem com suas próprias mãos, sem que a vítima tenha oportunidade de provar sua inocência, são difíceis de compreender, ainda mais com o envolvimento de tantas questões, como no caso de Chapecó”.


Boa leitura!

“Casamento, amor e desejo no ocidente cristão”


Quem nunca sonhou com a marcha nupcial? Festa, convidados e amor eterno? A esperança de ser feliz a dois, ter companhia e alguém para trocar o que se tem de melhor?
Desde que o conhecemos, o casamento é um sacramento a ser realizado por todos os homens de bem, independente de sua religião. Um sacramento abençoado por Deus. Mas, será que foi sempre esse o conceito dado à união de duas pessoas?
A resposta pode parecer curiosa, mas, é não. Nem sempre o casamento foi visto como algo positivo à sociedade. “Casamento, amor e desejo no ocidente cristão”, de Ronaldo Vainfas, revela o porquê de o ato conjugal ser tomado como pecado por, aproximadamente, onze séculos. Segundo o autor, o casamento feria a moral cristã, que estava longe de ser mero rosário de apologias e condenações. Conforme pregavam os cristãos, os perigos da vida conjugal eram enormes, desde as dificuldades de convivência diária à escravidão de se submeter ao outro carnalmente. Toda essa repúdia vinha do fato de que se a virgindade correspondia à verdade e à liberdade, o casamento equivalia à mentira e à escravidão.
Longe de ser sacramento ou mandamento divino, o ato conjugal era um remédio, também conhecido como a “terapêutica do desejo”. Melhor seria que todas as pessoas vivessem castas, mas se não podiam conter-se deveriam casar. Afinal, homens e mulheres se uniam de algum modo e era preciso regularizar a situação. A partir daí, o casamento passou a ser uma prática menos indesejada. Conforme o autor, “voltado exclusivamente para a procriação, o casamento era um bem, embora fosse o pior dos bens”.
O amor conjugal não se impôs como valor ideal do casamento antes do século XIX. Amar, conforme é citado, significava entregar-se a Deus com a alma piedosa e o corpo imaculado, ou seja, não se concebia o amor entre um homem e uma mulher, mas sim o amor a Deus, somente a Ele. E esse amor era o mesmo que obediência, adoração e desencarnação.
Elevado ao mundo do sagrado, redimido enquanto instituição, o casamento foi aceito como espaço legítimo para o uso dos prazeres, desde que voltado para o seu fim natural de reprodução. Mas a concepção do sexo como um mal em si persistiu, e ainda persiste, como um dos sete pecados capitais: a luxúria. E, luxuriosos, segundo Vainfas, eram todos os que, fora do casamento, recusavam a castidade e os que, no seu interior, buscavam o prazer.
“Os cônjuges deveriam querer o bem um do outro, deveriam até manter alguma amizade, desde que no âmbito da caridade”, cita o autor.


Boa Leitura!


“As intermitências da morte”
 

Quem, por um dia sequer, ou algumas poucas horas não sentiu medo da morte? Um pavor que vem do nada, ou surge do simples despertar da imaginação que acaba em tristes pensamentos de o que seria do amanhã sem a existência de cada um de nós. Um sentimento que cada um alimenta a sua maneira e que o escritor português José Saramago descreve muito bem em “As intermitências da morte”, lançado pela Companhia das Letras no ano de 2005.
Em um badalar do relógio ninguém mais morreu na pacata cidade criada por Saramago. Uma cidade que se vê envolta pela ‘mão’ gelada e cálida da morte. E são todas as peripécias do que um acontecimento como este pode gerar que o autor explora neste pequeno romance. Com sarcasmo e ironia, deixa claro sua crítica às reações da Igreja, do Governo, dos filósofos, dos economistas, das funerárias, da máfia (e etc) diante de uma nova realidade.
Em algumas poucas páginas pode-se dialogar com a tão temida morte. Ela que nunca falha e que nunca dorme. Que nunca se deixa levar por nada, mas que de repente ‘resolve’ dar uma trégua aos pretensiosos mortais que tentam, a todo o custo, dar explicações para tudo o que acontece neste mundo como se nada estivesse fora de seu alcance.
É a morte desnuda e tácita que Saramago descreve. A morte como ela é. E, ao final, sem que seja possível perceber ou, simplesmente, sem que seja necessário desejar, nos encontramos envolvidos por um ar que não é mais tão frio como antes.
Ganhador do Premio Nobel de Literatura em 1998, Saramago tem uma vasta obra. Dentre alguns de seus livros estão: “A bagagem do viajante”, “A caverna”, “Todos os nomes”, “O que farei com este livro”, “o Evangelho segundo Jesus Cristo”, “A maior flor do mundo” e “Ensaio sobre a cegueira”.
Boa leitura! 

“Assassinatos na Academia Brasileira de Letras”
 

“Quem é vivo sempre aparece, às vezes morto!”.
Pitadas de humor e graça como esta fazem parte do enredo criado pelo comediante, dramaturgo e escritor Jô Soares em “Assassinatos na Academia Brasileira de Letras”. Publicado em 2005 pela Companhia das Letras o livro é o best seller do autor.
A obra, embora apresente grande pesquisa histórica, é extremamente ficcionista. Misturando realidade e sátira à nostálgica imaginação do autor, “Assassinatos na Academia Brasileira de Letras” proporciona boas risadas aos leitores que se vêem rodeados por mistérios, intrigas e, por mais estranho que soe, assassinatos de imortais.
É assim, brincando com as palavras, que o autor reconstrói o Rio de Janeiro de 1924; descreve personagens bizarros (Machado Machado, Galatea, Camilo Rapozo, dentre outros) e prende a atenção dos leitores do início ao fim de cada uma das 252 páginas.
Jô Soares é autor de “O flagrante”, “O astronauta sem regime” e “O humor nos tempos de Collor”. Como romance, também escreveu “O Xangô de Baker Street” que foi publicado no ano de 1995, lançado em 12 países e adaptado para o cinema em 2001 e “O homem que matou Getúlio Vargas”, de 1998, que teve sete edições estrangeiras. Juntas, só estas duas últimas obras venderam 1,3 milhão de exemplares no mundo.
Boa leitura!


“Dicionário nada convencional”
 

Dicionários, na maioria das vezes, são chatos e grandes. Grandes de mais para que possa ser absorvido o conteúdo apresentado. Por isso, são usados em casos específicos de procura. Geralmente são construídos por um rol de verbetes e possíveis conceituações. Mas não o “Dicionário nada convencional” da antropóloga Arlene Renk.
O “Dicionário nada convencional”, lançado no ano 2000, como o próprio nome sugere, foge de qualquer padrão de dicionários com conceitos conservadores e meras significações. O “Dicionário nada convencional” não segue a seqüência alfabética, ao invés, coloca os termos encadeados, de modo que o último vocábulo invoque o seguinte. Além desta particularidade, o dicionário traz temas contextualizados, ligados uns aos outros e, como cita a própria autora na apresentação do livro, “a ludicidade do texto está em não querer atribuir-lhe um ranço de sisudez, para que os verbetes possam ser degustados com calma e sorvidos em pequenos goles. Ao leitor, fica a liberdade de pulá-los, se assim quiser”.
O livro apresenta 54 verbetes, o primeiro tema abordado é “negro”, cuja definição atribuída é: “designação da população africana”, onde a cor da pele indicava a que raça pertenceriam determinados indivíduos. “Raça é uma criação da história da expansão colonialista européia” e segundo esta denominação, aqueles que não eram brancos e cristãos eram diferentes. “E ser diferente era sinônimo de atrasado e inferior”. E, assim segue o livro. Alguns dos outros temas são: outro, etnocentrismo, racismo, mitologias, contra-história, oeste catarinense, religião, etc.
As fotos que seguem a contextualização feita no livro são da jornalista e fotógrafa, Eliane Fistarol.
Boa leitura!

“Eu sei que vou te amar”


“Você vai entrar pela porta que eu deixei entreaberta,
há uma hora que eu não descolo os olhos
da luz de néon do hall que se filtra como um prenúncio da tua chegada.
Antes de você chegar, você já chega
como uma nuvem que vem na frente...”

“Você me chamou por telefone.
Não te vejo há três meses...
seis anos juntos e agora sem te ver...
pela tua voz no telefone sei que você
está controlando uma emoção,
querendo bancar o homem seguro de si...
e fico desesperada....”

Os trechos acima dão início ao intrigante (e excitante) diálogo criado por Arnaldo Jabor em “Eu sei que vou te amar”, lançado em 1986. Depois de um casamento de seis anos, depois de muitas mentiras, mas também muito amor, uma conversa. Uma conversa difícil em que se pretende falar a verdade como nunca antes. A verdade forjada em sorrisos e carinhos despropositados de um casamento que acabou. Na busca dessa verdade incondicional surgem lágrimas, lembranças e sentimentos controlados para não transparecer tudo. Tudo o que realmente sentiam...
Depois de horas de intenso diálogo, a porta volta a ficar entreaberta, dessa vez para ela sair. Mas nem um nem outro queriam que a porta fosse ultrapassada. Tanta coisa a ser dita... talvez não fosse realmente o fim... talvez fosse a hora de esperar o momento certo.
De maneira esplendida, Jabor nos deixa inteiramente envolvidos pelo destino destes dois apaixonados a procura da verdade do amor. E por isso, Jabor faz questão de lembrar que “a vida só é vida no limite da loucura...e que você só está vivo na beira da morte... só assim vale viver”.
Boa leitura!

“A genealogia da moral”
 

“As minhas idéias acerca da origem dos nossos preconceitos morais hão de achar a sua primeira expressão lacônica, e provisória, na coleção de proposições rotuladas, onde tudo que se chamou de moral nada mais foi que um envenenamento da vida”. Assim inicia “Genealogia da moral” de Friedrich Wilhelm Nietzsche, escrito em 1887 como um complemento de sua obra anterior intitulada "Além do bem e do mal”, de 1886. O livro é composto por três ensaios que tratam de temas como a separação dos valores entre bem e mal – bom e mau; a má consciência e o ideal ascético que acompanha o ser humano.
“A genealogia da moral” aponta o surgimento e o real significado do que é valor ou juízo de valor. Para isso, o autor busca na história elementos que justifiquem o porquê adotamos determinados conceitos como certos, ou porquê assumimos determinada posição diante de algum fato que “surpreenda a nossa moral”. Durante todo o livro, o que Nietzsche procura é esclarecer a verdade: a verdade do existente, das ciências e da metafísica. A verdade sobre os valores morais tradicionais. Para Nietzsche, “o problema da moral, é, definitivamente, um problema de verdade, da conformidade à vontade de domínio enquanto essência de vida (...), pois só há valores à medida que a própria vida os estabelece”.
Nietzsche coloca a importância de perceber que os valores que temos hoje como moral foram construídos por seres humanos, com todas as suas fragilidades e intenções. Ou seja, o valor defendido por estes não correspondem aos mesmos defendidos por pessoas com atividades e pensamentos diferentes. Assim, é necessário perceber o verdadeiro valor intrínseco em cada um destes conceitos. 
Boa leitura!

“Cazuza: Só as mães são felizes”


Na maioria das vezes, quando somos questionados sobre algumas coisas buscamos, da melhor maneira possível, responder de imediato e com alguma certeza. Mas, e se lhe perguntasse qual é a cor do amor, por exemplo, o que me responderia? Ou, qual é a cara da morte? Paciente, injusta, pálida, cruel, taciturna? Qual é a cara da morte?! Talvez a resposta esteja nas mãos de um poeta.
Um poeta chamado Cazuza, que não tardou em dizer que a cara da morte estava viva. Viva a ponto de levá-lo para junto de si. E, assim, o poeta se foi. Mas, deixou a quem quer que deseje ouvir verdadeiros poemas transcritos em notas musicais de sentimentos rebeldes, apaixonados e, também, sedutores.
Carinhoso e desafiador. Sensível e ousado. Assim é descrito Cazuza em “Só as mães são felizes”, um depoimento de Lucinha Araújo à jornalista Regina Echeverria. No livro, é possível conhecer não só o poeta, mas o menino, o garoto que queria mudar o mundo. Um menino que buscava uma ideologia capaz de fazê-lo viver; que o permitisse sentir o prazer do risco da vida; de sentir o prazer do rock’n roll. No livro, não conhecemos apenas o “ídolo” Cazuza, conhecemos o “Caju” sedutor, apaixonado, frágil e inquieto. Cazuza afrontou, com suas letras e músicas, uma década de 80 conservadora, autoritária e hipócrita e se entregou ao mundo.
Este mesmo poeta seguiu a sua estrela, o seu brinquedo de estar. Continuou inquieto, descobrindo que país é esse e pedindo para que o Brasil mostrasse a sua cara. O Brasil não mostrou, mas ele sim. Em 1990, vimos o Cazuza nu, envolto apenas pela luta de viver, de gozar um pouquinho a mais os acasos desta vida “tão desconhecida e mágica”. Nem que para isso fosse preciso fantasiar “segredos ao ponto aonde se quer chegar”.
Incontáveis são as frases de Cazuza que poderiam ser aqui citadas. Incontáveis também são os sentimentos que transpiram a cada fala, a cada toque, a cada som dos amores inventados por ele.
Talvez, por tantos atributos, seja possível dizer que o poeta não morreu. Ficou na lembrança. O ousado sedutor. O sensível atrás de amor, prazer e liberdade. É por este Cazuza que Lucinha Araújo diz: “nem todas as mães são felizes”.


Boa Leitura!



“O corpo fala”

Olho para o lado, tem uma pessoa na fila de espera. Ela parece tensa. Mexe no cabelo, balança o pé num ritmo simétrico. Enquanto aguardo a minha chamada fico imaginando o que esta pessoa está sentindo: medo? Ansiedade? Desejo? Nostalgia? O que passa na cabeça deste indivíduo? Nesse momento, paro e penso: será que estes sinais (mexer no cabelo, balançar o pé...) realmente revelam alguma informação? Os autores Pierre Weil e Roland Tompakow afirmam que sim. Existe muita informação transmitida pela linguagem do corpo. No livro “O corpo fala: a linguagem silenciosa da comunicação não-verbal” conhecemos um corpo que irradia informações, por vezes inconscientes. O corpo revela a todos os instantes aquilo que nem sequer falamos ou mesmo desejamos pensar. E, de repente, como algo automático, lá estão eles, carregados de significação. Às vezes os sinais são tão discretos que só uma pessoa muito atenta pode perceber. Outros, no entanto, saltam aos olhos. Mas, o que nos falta, além de percebê-los, é entender o que essa linguagem quer nos dizer. De maneira descontraída os autores tentam nos “abrir os olhos” para estas manifestações corporais. São dicas que nos levam a conhecer outro lado da comunicação. É o roer de unha, o trançar o cabelo, um corpo inclinado, outro retraído, a boca que se movimenta, as mãos no bolso (para eles), as mãos no cabelo (para elas), enfim, cada um destes movimentos dizem algo mais que nossos olhos não vêem. Primeiro os autores nos levam a conhecer separadamente cada parte do corpo: a águia (cabeça), o tigre (tronco) e o boi (membros inferiores). Tendo em mente esta divisão, passamos a conhecer alguns sinais, como por exemplo: quando um casal está sentado, um ao lado do outro, e os pés e joelhos estão virados no mesmo sentido significa a afirmação de que estão realmente unidos; e quando estamos tristes e nos colocamos a chorar sentadas num canto, encolhidas, o que significa? Isso demonstra, segundo os autores, um sentimento de desproteção, ou “ainda não nasci”: preciso de atenção; o ato de roer unhas, tão comum e inevitável para algumas pessoas, significa nada mais que “estou me roendo por dentro”. Muitas vezes acontece que, numa conversa, não podemos ou não queremos externar nossos sentimentos. Isso também é expresso pelo corpo: lábios presos significa: prefiro não me comunicar; lábios presos entre os dentes: não quero entrar nessa conversa; mão escondendo a boca: um sinal para esconder a indecisão de falar. Estas e muitas outras explicações de como se mostra nossa linguagem não-corporal pode ser aprendida em uma leitura rápida, de fácil acesso e instigante. Quando menos percebemos estamos loucos de vontade de imaginar o que esses sinais significam e passamos, então, a observar com outros olhos as coisas que acontecem ao nosso redor. 
Boa Leitura!

“A cidade do sol”
 
Quando ouvimos falar em guerra nos surge uma vaga idéia de cidades destruídas, famílias separadas e um futuro incerto. Assim são nossas concepções sobre guerras, geralmente distantes. Distantes o suficiente para que possamos continuar nossas vidas do mesmo jeito, com a mesma rotina. Mas a guerra pode mudar e muito a vida daqueles atingidos por suas mãos cálidas e impiedosas. E, é por estas falamos sobre “A cidade do sol”, de Khaled Hosseini, lançado no ano de 2007. O livro apresenta um retrato da vida em guerra no Afeganistão, desde 1980 aos anos de 2003, tratando também da questão dos refugiados afegãos que se instalam em regiões vizinhas como o Paquistão e o Irã.
É essa guerra que mudou a vida de Mariam. Uma pessoa que desde muito cedo entendia que sua existência não tinha nenhuma importância. Que sua vida não passava de um peso, uma desonra para sua “pobre mãe”. Mas Mariam acreditava ter um pai que a via de maneira carinhosa e amável. Não tardou a entender que este mesmo pai, gentil e bondoso, poderia levá-la a um caminho nunca antes imaginado e quando pode perceber se encontrava, aos 14 anos, casada com Rashid. Mariam aos poucos percebia qual era o seu destino e seguiu com seu esposo para Cabul, capital do país.
Na mesma cidade de Cabul viviam Laila e Tariq. Duas crianças criadas bem diferentes de Mariam, mas que se encontraram unidas pelo desespero trazido com a guerra. Tariq e Laila não conseguiam esconder uma grande paixão. Mas, a guerra não tem ouvidos para histórias de amor, sonhos e esperanças. E, assim, sem esperança alguma Mariam e Laila estavam juntas. Juntas sofreram e desacreditaram na possibilidade de verem campos verdes e jardins. Mas, um dia “A cidade do sol” reapareceu e a história, enfim, poderia ser diferente. O sol talvez voltasse a brilhar e aquecer. E a guerra? Esta continuava barulhenta, insensata e covarde.
Khaled Hosseini nasceu em Cabul, Afeganistão, e mudou para os Estados Unidos em 1980. É autor do best-seller “O caçador de pipas”, lançado em 2006. 
Boa Leitura!

"Amor é prosa, sexo é poesia"

Nostálgico, exaltado, corriqueiro... Assim se apresenta “Amor é prosa sexo é poesia: crônicas afetivas” de Arnaldo Jabor, lançado em 2004, pela Editora Objetiva. O mesmo incansável cineasta e crítico político apresenta, nas 193 crônicas do livro, textos recheados de bom humor e sarcasmo.
Seja nas crônicas sobre bumbuns, chatos, ou ainda sobre os hippies e os dias melhores que nunca vem, Jabor se inclui na história em questão e transforma tudo em um relato pessoal. E assim, participando do enredo, transforma as crônicas em muito mais que um texto bem escrito e com boas sacadas, mas principalmente dá vida e forma ao conteúdo descrito.
De maneira audaciosa, o autor apresenta o que é o amor e o que é o sexo na vida destes indivíduos carentes de atenção e de valores. Assim, segue abaixo um pequeno trecho da crônica, também intitulada, “Amor é prosa, sexo é poesia”:
“O amor tem jardim, cerca, projeto. O sexo invade tudo. Sexo é contra a lei. O amor vem depois. O sexo vem antes. O amor sonha com grande redenção. O sexo só pensa em proibições. Amor é casa; sexo é invasão de domicílio. Amor é o sonho por um romântico latifúndio; o sexo é o MST. Amor é um texto. Sexo é esporte. O amor vem de dentro, o sexo vem de fora, o amor vem de nós e demora. O sexo vem dos outros e vai embora. Amor é bossa nova; sexo é carnaval”.
São obras do autor: “Sanduíches de Realidade”, “A invasão das Salsichas Gigantes”, “Pornopolítica” e “Eu Sei Que Vou Te Amar”. 
Boa leitura!

"Desarmando o Iraque"

Nem ficção, nem romance. Esta semana apresentamos o relato do chefe dos inspetores na ONU, Hans Blix. Ex-diretor geral da Agência Internacional de Energia Atômica e atual presidente da comissão Internacional de Armas de Destruição em Massa, Hans Blix coordenou todo o processo de inspeção realizado no Iraque no período de 2000 a 2003. São as experiências adquiridas nestes trabalhos que Blix descreve em “Desarmando o Iraque: inspeção ou invasão?”. Uma narração carregada de tensão e diplomacia.
Lançado em 2004 pela editora “A Girafa”, a obra de Blix oferece minuciosas informações das decisões tomadas nos bastidores do Conselho de Segurança da ONU no processo de inspeção realizado no Iraque. Todo este processo de inspeção realizado e instigado após os ataques de 11 de setembro aos Estados Unidos, surge a fim de apontar a existência ou não de armas de destruição em massa no país.
Muitos são os questionamentos expostos pelo autor sobre a necessidade dos Estados Unidos (e alguns países aliados) organizarem e efetivarem a invasão nas terras iraquianas. Dúvidas estas alimentadas durante as 397 páginas do livro.
“Desarmando o Iraque: inspeção ou invasão?” revela um mundo ditador, cheio de temores e incertezas. Um mundo à espera de (apenas) uma confirmação: guerra ou paz? E, como cita o autor: “a guerra não era inevitável, mas uma clara possibilidade”.
Boa leitura!

“Meninos em guerra”

“Esta não é uma história fácil de ouvir, nem de contar. Mas é uma história que precisa tanto ser ouvida como contada”.
O trecho acima faz parte do livro “Meninos em guerra: história de amizade e conflito na África” escrito pelo consultor da ONU (Organizações das Nações Unidas) Jerry Piasecki e lançado em 2006 pela editora Ática.
O livro narra à história de Thomas e Deng, adolescentes africanos seqüestrados e obrigados a guerrilhar em nome da Frente de Resistência Democrática – FRD. Adolescentes que, assim como muitas outras pessoas de diferentes partes do mundo, vivem em guerra, muitas vezes sem saber o porquê. Guerra por vezes intitulada de “Santa”, mas que deixa marcas de sangue em pessoas inocentes, vítimas da ambição e do descaso social.
Através de Thomas e Deng o autor nos leva a conhecer outras crianças e adolescentes que perderam suas famílias e amigos e partiram para a guerra. Guerra sem restrição de idade, que não perdoa e não dá descanso. Guerra que transforma vidas e pessoas.
E, é essa guerra cruel e fria que Jerry Piasecki relata tão bem em “Meninos em guerra”. Impossível não temer e não sentir dor em meio ao relato no livro.
Nós temos de fugir! – disse Thomas a Deng enquanto olhava o teto, tentando lembrar e esquecer de algumas coisas. – Se a gente ficar, vamos ter de morrer lutando ou de matar mais gente!”. 

Boa leitura!

Rota 66


A primeira resenha que me atrevi a escrever foi sobre um clássico nacional e, como não poderia ser diferente, um clássico estudado e aplaudido nas aulas de jornalismo: “Rota 66”, do jornalista Caco Barcellos, lançado em 1992 pela editora Record. Com uma narrativa contagiante, o livro aborda a atuação da polícia militar, Ronda Ostensiva Tobias de Aguiar, mais conhecida como ROTA, e o seu envolvimento com o assassinato de 4.200 pessoas ocorridos entre as décadas de 1970 e 1980. Em meio a leitura, impossível não pensar (ou desejar) que se trata apenas de uma obra ficcional, mas não. A violência, a covardia e a falta de respeito aos direitos humanos relatados pelo jornalista revelam uma realidade cruel e mascarada. Uma realidade que não perdoa e não pede licença. Simplesmente, invade casas, carros, “fuscas azuis” e condena.
Ganhadora de oito prêmios de direitos humanos e do Prêmio Jabuti de Literatura, um dos mais prestigiados do país, a obra de Caco Barcellos retrata as ações do “esquadrão da morte oficial”, onde as vítimas eram quase sempre jovens pobres, pardos e negros e, em muitos casos, sem antecedentes criminais.
O livro é resultado de oito anos de pesquisa do jornalista que, entre as 350 páginas, traduz a realidade de um país violento, preconceituoso e medíocre. Não é difícil imaginar porque “Rota 66” é considerado um dos melhores livros de jornalismo investigativo do país.

Boa Leitura!

“A noção de cultura nas ciências sociais”

Quando falamos em cultura ou identidade cultural logo nos vem à cabeça um leve sentimento de confusão. Afinal, entender e explicar estes conceitos merece cuidado. A parte o senso comum, dificilmente ouvimos o conceito de cultura, por exemplo, tal como propõe alguns autores. Isto se dá por uma distorção que temos desta conceituação. Por vezes falamos, ou ouvimos falar, que “tal pessoa tem cultura”, afirmando assim a cultura como algo que se conquiste com estudo e em livros, tal como o conhecimento. Esta inversão de conceitos torna o tema ainda mais pertinente. Por isso, a dica: “A noção de cultura nas ciências sociais”, de Denis Cuche.
Conforme o autor, o conceito de cultura obteve, há algum tempo, um grande sucesso fora do círculo estreito das ciências sociais ganhando espaço em outros debates. E, para discutir cultura é necessário ter em mente seu processo dinâmico, onde ela pode ser classificada como um conjunto de significações comunicadas pelos indivíduos de um dado grupo através da interação com outro. Cuche destaca que existe uma estreita relação entre a concepção que se faz de cultura e a concepção que se tem da identidade cultural. Mas o que é esta “identidade”?
Segundo o autor, no âmbito das ciências sociais, o conceito de identidade cultural se caracteriza por sua polissemia e sua fluidez. Ou seja, suas variadas significações. A “recente moda da identidade” de que fala o autor é o prolongamento do fenômeno da exaltação da diferença que surgiu nos anos setenta e que levou tendências ideológicas muito diversas e até opostas: de um lado os que fazem apologia da sociedade multicultural e, de outro, a exaltação da idéia de “cada um por si para manter sua identidade”. Esta dualidade de conceituações leva a pensar a identidade como resultante das diversas interações entre o indivíduo e seu ambiente social, próximo ou distante. E, é através deste ambiente que o indivíduo se localiza e é localizado. Assim, “a identidade social de um indivíduo se caracteriza pelo conjunto de suas vinculações em um sistema social: vinculação a uma classe social, a uma classe de idade, a uma nação, etc”.
Pensando a cultura como algo dinâmico, suscetível a mudanças, é possível perceber que as manifestações culturais também o são. Isto é, se em determinada época alguns valores e atividades eram praticados por determinado grupo, estes podem mudar com o passar do tempo e com o contato de outros grupos. Assim, perceber fatores intrínsecos nas manifestações culturais requer avaliar de maneira detalhada dos fatores que particularizam determinados grupos, tais como a língua (linguagem), hábitos alimentares, organização social, etc.


Boa Leitura!
“Jornalismo na era virtual”


Há quem afirme que hoje as redações jornalísticas são mais silenciosas, com o uso de computadores ao invés da máquina de escrever; mais femininas e com menos fumaça, pela diminuição do número de jornalistas fumantes. Estas expressões são utilizadas para ‘distanciar’ o jornalismo atual daquele praticado no início da profissão. O chamado jornalismo de boteco, romântico ou de bico.
Este “velho jornalismo” se contrapõe ao “novo” carregado de novas tecnologias, relações de poder e, também, novos interesses. É sobre o novo e o velho jornalismo que Bernardo Kucinski trata em “Jornalismo na era virtual: ensaios sobre o colapso da razão ética”.
Conforme o autor, os jornalistas eram marcados pela “vocação profissional”, também chamada de “dom”. Esta era a marca registrada dos jornalistas que, na época da ditadura militar, buscavam com fervor solidificar e valorizar a profissão. Com ou sem medo, os jornalistas ousavam e mostravam para a sociedade que os caminhos a serem seguidos poderiam ser outros que não a ditadura. O jornalismo (“romântico”?) praticado naquele período delimitou as características da profissão: ousada, irreverente e inquieta.
Segundo o autor, com a chegada da democracia, a responsabilidade atribuída aos jornalistas foi ainda maior. No entanto, ao invés da democracia abrir mais interfaces de conflito entre o jornalismo e o Estado e aumentar o espaço e a profundidade da crítica, tornou-se ainda mais superficial. Pois, os veículos de comunicação despertam interesses e aguçam a vontade de muitos em fazer parte deste grupo.
Kucinski também reflete sobre a dualidade de opiniões quanto a formação acadêmica mediante a técnica oferecida pelas redações e o conhecimento adquirido nos bancos universitários.
Existe, conforme o autor, o chamado “vazio ético” que denomina a falta de uma concepção idealista de ética, ou seja, a ética formada pelo “imperativo categórico da verdade”. Este “vazio ético” é reforçado por mecanismos diversos: a fusão mercadológica de notícia, entretenimento e consumo; a concentração de propriedade na indústria de comunicação; a crescente manipulação da informação por grupos de interesse, e, principalmente, a mentalidade pós-moderna que celebra o individualismo e o sucesso pessoal, muitas vezes caracterizado como a espetacularização da informação.
No livro, o autor também alerta para a falta de pluralismo na mídia brasileira. Esta que se diz extremamente modernista e, no entanto, ainda carrega fortes traços de conservadorismo. Onde a lógica do mercado se baseia na manipulação dos desejos e das carências individuais da população.
Para Kucinski, vivemos uma era discursiva, marcada pela negação das utopias e pela ausência de um padrão ético hegemônico. Isto é, a ética da pós-modernidade é caracterizada pelo ceticismo, cinismo, sucesso pessoal e liberdade individual. E, é por tudo isso o autor afirma: “o bom jornalista é, necessariamente, um jornalista ético, que sabe ser alérgico ao mau jornalismo e à manipulação desonesta da informação”.


Boa Leitura!
“11 de setembro”


Quem não lembra da gritaria, das feições de horror e do sentimento de desamparo deixado pelos ataques de 11 de setembro? Mais do que ataques às torres gêmeas (até então desconhecidas por muitas pessoas), o atentado de 11 de setembro mostrou à grande parte do mundo uma nação fragilizada, perplexa e atônita: os Estados Unidos da América. E, a partir destes atentados foi possível perceber também que nem só de ‘fragilidade’ vivem os Estados Unidos, mas sim de uma vasta história de repressão e autoritarismo.
“11 de setembro”, de Noam Chomsky, traz uma série de entrevistas do autor a jornalistas de diversos lugares do mundo no período de um mês após os atentados ao World Trade Center e ao Pentágono. O livro apresenta uma série de entrevistas sobre a questão política, econômica, social e histórica desta nação que hoje é uma das maiores potências do globo. Segundo o autor, “as horripilantes atrocidades cometidas no 11 de setembro são algo inteiramente novo na política mundial, não em sua dimensão, mas em relação ao país atingido”.
Noam Chomski coloca que a história dos EUA é recheada de atitudes sanguinárias em relação a países subalternos em questão política, econômicas, sociais e culturais cultivadas. Por isso, os ataques após o 11 de setembro se explicam mais facilmente: eles não eram tão novidade como se imaginava. Já haviam sido praticados em outros séculos, outras décadas, outras sociedades. Assim, coloca o autor, é normal que toda a Europa em si sinta-se imensamente surpresa com os atentados. “Pela primeira vez na história moderna, a Europa e seus agregados foram vítimas, em solo pátrio, da mesma espécie de atrocidades que, rotineiramente promoveram no exterior”.


Boa Leitura!
“A sociedade do espetáculo”


Esta semana o Guia do Leitor apresenta a teoria crítica de Guy Debord à sociedade do espetáculo. Lançado em Paris no ano de 1967, o livro foi relançado no Brasil em 1997, pela editora Contraponto sob a tradução de Estela dos Santos Abreu, “A sociedade do espetáculo” traz 237 páginas de intensas e bem estruturadas críticas sobre a chamada “sociedade espetacular” e suas representações.
De maneira clara, mas não simplista, o autor coloca alguns dos fatores que transformam (transformaram) a sociedade atual em um conglomerado de pessoas sutilmente domesticadas sob um modelo dominante. Nesta sociedade a banalização e a generalização são a porta de entrada para grandes mercados comerciais que supervalorizam o lucro e as cordialidades de suas relações, lugar onde a mercadoria e a “ditadura da economia” ocupam totalmente a vida social das pessoas. A origem deste espetáculo, segundo o autor, vem da necessidade do mundo em participar de um mesmo bloco, de uma mesma organização consensual de mercado alienando comunidades inteiras em uma mesma necessidade.
Já no prefácio do livro (escrito em 30 de junho de 1992) pode-se ter uma idéia de como esta teoria crítica é apresentada: “é preciso ler este livro tendo em mente que ele foi escrito com
o intuito deliberado de perturbar a sociedade espetacular. Não exagerou em nada”. 
Boa Leitura!
“Cercas e janelas”


Esta semana apresento traz uma coletânea de artigos, ensaios e discursos sobre globalização. “Cercas e janelas: na linha de frente do debate sobre globalização”, de Naomi Klein, retrata inúmeras situações vivenciadas por militantes de todo o mundo contrários não, simplesmente, a globalização, mas à maneira como as propostas desta ideologia são aplicadas em diferentes sociedades.
Lançado em 2003 pela editora Record e traduzido por Ryta Vinagre, “Cercas e anelas” é, segundo a própria autora, um registro de seu aprendizado sobre o futuro da economia global e suas implicações não apenas econômicas, mas, principalmente, sociais.
No total, são 42 artigos, ensaios e discursos divididos em cinco capítulos: “Janelas da discordância”, “Cercas na democracia”, “O mercado engole o bem comum”, “Cercas no movimento: criminalizando a dissidência”, “Tirando proveito do terror” e “Janelas para a democracia”.
São textos escritos para The Globe and Mail, The Guardian, The Los Angeles Times e muitos outros jornais. Naomi Klein, afirma que este livro é o registro de “um importante começo” na vida do movimento antiglobalização que explodiu em Seattle e que evoluiu através dos acontecimentos de 11 de setembro e suas conseqüências. Com as inúmeras experiências apontadas no livro, é possível ter uma nítida noção da atual conjuntura sócia-política e econômica de países desenvolvidos e também em desenvolvimento.
Naomi Klein é canadense, autora do best seller “Sem logo”.
Boa Leitura!
“Oroonoko”


“Cézar, morto de dor, mas feliz com a nobre determinação de Imoinda, abraçou-a tomado pela paixão e pela languidez de um amante prestes a morrer, sacou de sua faca para dar fim a este prazer de seus olhos, a este tesouro de sua alma”.
Escrito em 1688 por Aphra Behn, “Oroonoko ou o escravo real: uma história verdadeira” foi traduzido por Évilo Antônio Funk e relançado em 1999 pela Editora Mulheres.
Romance da literatura inglesa, “Oronooko” revela uma história que, segundo a autora, é fidedigna a realidade dos fatos acontecidos na época. História protagonizada por um africano escravizado e levado ao Suriname durante a década de 1660. Nas palavras da própria autora, “Oroonoko e sua amada representam a mais absoluta idéia do primitivo estado de inocência, antes que o homem tenha aprendido a pecar”, e é toda a trajetória deste amor que pode ser vista, imaginada e sentida neste curto romance escrito a, aproximadamente, 300 anos.
A obra foi inspirada nas viagens realizadas pela autora às colônias sul-americanas, que, além de descrever com detalhes lances deste amor, abordou situações de desumanidade e sadismo praticados com os escravos (africanos e índios) da época.
Boa Leitura!
“Os Catadores de Conchas”


Um romance que emociona e seduz o leitor tornando-o parte da história. Assim é “Os Catadores de Conchas” de Rosamunde Pilcher. Lançado em 1988, na Inglaterra, com a tradução de Laísa Ibañez pela editora Bertrand Brasil, ocupa hoje um dos principais lugares na lista dos mais vendidos.
Em meio à leitura é possível sentir o cheiro das flores, o gosto das comidas, escutar o barulho das bombas caindo, sentir a lágrima escorrer. A cada página é possível conhecer e delirar com a vida dos personagens. Pessoas que vêem suas vidas moldadas pela Segunda Grande Guerra e que, ao fim da leitura, deixam saudade.
Ao longo das 632 páginas conhecemos Penélope: uma mulher rodeada de amigos e lembranças. Filha de um grande pintor vitoriano e mãe de três filhos. E, é através dela que podemos conhecer tantas outras pessoas que fazem desta história fascinante, encantadora e surpreendente.
Rosamunde Pilcher tem o poder de fazer com que o leitor se sinta cercado por toda beleza descrita no livro. O desenvolvimento de seus personagens é tão bem elaborado que se torna impossível deixar o livro pela metade.
“Os Catadores de Conchas” é a 13° obra da autora que teve seu primeiro livro publicado em 1949 - Half-way to the Moon -, com o pseudônimo de Jane Fraser. Com este nome, a autora assinou outros 10 livros. Sua primeira obra com o verdadeiro nome foi A Secret to Tell, publicado em 1955.
Dentre outros títulos da autora estão: “Flores na Chuva”, “Sob o Signo de Gêmeos”, “A Casa Vazia”, “O Fim do Verão”, “Um Encontro Inesperado”, “O Regresso”, “Com Todo o Amor” e “O dia da Tempestade”.
Boa Leitura!
“Que corpo é esse?”


“As conceituações do corpo através da história da humanidade nos revelam características importantes do pensamento filosófico, que sempre privilegiou a mente em detrimento do corpo. [...] Durante a vida, mente e corpo formam uma unidade indissolúvel que, com a morte, é rompida, tendo a alma sua imortalidade garantida enquanto o corpo vira pó”. Mas “Que corpo é esse”?
Lançado pela Editora Mulheres em 2007 e escrito por Elódia Xavier, “Que corpo é esse? O corpo no imaginário feminino” traz vários textos produzidos desde o início do século XX até hoje. Através de narrativas de diferentes autoras, o livro contextualiza as representações do corpo feminino. Um corpo que pode ser invisível, subalterno, disciplinado, envelhecido, imobilizado, refletido, violento degradado, erotizado e liberado.
Em cada texto escolhido por Elódia Xavier é possível perceber as características destes diversos corpos em mulheres distintas. Características que por vezes revoltam, chocam, emocionam e aproximam mulheres de todos os tipos. Indiferente do motivo que leva uma ou outra a se encaixar em qualquer das categorias elaboradas, todas são mulheres que, em algum momento, padeceram em silêncio. Mulheres que por alguns instantes, obedeceram a regras sem sentir, sem desejar e, muitas vezes, sem ao menos perceber.
As autoras escolhidas por Elódia Xavier são: Carolina Maria de Jesus, Clarice Lispector, Fernanda Young, Helena Parente Cunha, Heloísa Seixas, Júlia Lopes de Almeida, Lya Luft, Lygia Fagundes Telles, Márcia Denser, Marilene Felinto, Marina Colasanti, Martha Medeiros, Nélida Piñon, Raquel de Queiroz, Rachel Jardim e Wanda Fabian.
“Ser mulher, desejar outra alma pura e alada para poder, com ela, o infinito transpor; sentir a vida triste, insípida, isolada; buscar um companheiro e encontrar um senhor... Ser mulher, e oh! Ficar na vida qual uma águia inerte, presa nos pesados grilhões dos preceitos sociais!” (Gilka Machado).